sexta-feira, 19 de junho de 2009

080 - Vinícius de Morais " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "

VINÍCIUS DE MORAIS
Marcus Vinícius de Melo Morais
"Poetinha"(autocognominado)
Nasceu a 19 de outubro de 1913, signo de libra,
Rio de Janeiro(antiga capital do Brasil), Brasil.
Diplomata nos Estados Unidos da América,
França, Uruguai.
Trabalhou para a " B.B.C." em Londres.
Um dos ícones da "Bossa-Nova", estilo
de música brasileira, mundialmente conhecida,
no século XX.
Estilo Modernista.
Homenagens: Premio "Jabuti", 1994. . .
Faleceu em 09 de Julho de 1980, Rio de Janeiro, Brasil.


"Orquídeas" Foto LuisD.
*
CANTOePALAVRAS
O Caminho para a Distância, 1933; Forma e Exegese, 1935;
Ariana, a Mulher, 1936; Novos Poemas, 1938;
Cinco Elegias, 1943; Poemas Sonetos e Baladas, 1946;
Pátria Minha, 1949; Antologia Poética, 1955;
Orfeu da Conceição(musical), 1956;Livro de Sonetos, 1957;
Novos Poemas II, 1959; Para Viver um Grande Amor, 1962;
Orfeu da Conceição(teatro), 1962;
Cordélia e o Peregrino, 1965;
Para uma Menina com uma Flor(crônica), 1966;
A Arca de Noé(infantil), 1970 . . .
*
"Orquideas" Foto LuisD.

I
Eu te amo, Maria, eu te amo tanto
que o meu peito me dói como em doença
E quanto mais me seja a dor intensa
Mais cresce na minha alma teu encanto.
-
Como a criança que vagueia o canto
Ante o mistério da amplidão suspensa
Meu coração é um vago de acalanto
Berçando versos de saudade imensa.
-
Não é melhor o coração que alma
Nem melhor a presença que a saudade
Só te amar é divino, e sentir calma . . .
-
E é uma calma tão feita de humildade
que tão mais te soubesse pertencida
Menos seria eterno em tua vida.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
"Soneto da Contrição"
*
"Meu Jardim" Foto LuisD.

II
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
-
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
-
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama.
-
Eu possa me dizer do amor (que tive):
que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
"Soneto da Fidelidade"
Poemas, Sonetos e Baladas
*
III
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
-
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
-
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
-
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
"Soneto da Separação"


IV
Uma lua no céu apareceu
Cheia e branca; foi quando, emocionada
A mulher a meu lado estremeceu
E se entregou sem que eu dissesse nada.
-
Larguei-as pela jovem madrugada
Ambas cheias e brancas e sem véu
Perdida uma, a outra abandonada
Uma nua na terra, outra no céu.
-
Mas não partira delas; a mais louca
Apaixonou-me o pensamento; dei-o
Feliz - eu de amor pouco e vida pouca.
-
Mas que tinha deixado em meu enleio
Um sorriso de carne em sua boca
Uma gota de leite no seu seio.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
"Soneto de Despedida
Poemas, Sonetos e Baladas
*
V
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nosso mortos -
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar terra.
-
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos -
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
-
Não há muito que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez, de amor
Uma prece por quem se vai -
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
-
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte -
De repente nunca mais esperaremos . . .
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
"Poema de Natal"
Poemas, Sonetos e Baladas
*
VI
O mundo parou
A estrela morreu
No fundo da treva
O infante nasceu.
-
Nasceu num estábulo
Pequeno e singelo
Com boi e charrua
Com foice e martelo.
-
Ao lado do infante
O homem e a mulher
Uma tal de Maria
Um José qualquer.
-
A noite o fez negro
Fogo o avermelhou
A aurora nascente
Todo o amarelou.
-
O dia o fez branco
Branco como a luz
À falta de um nome
Chamou-se Jesus.
-
Jesus pequenino
Filho natural
Ergue-te, menino
É triste o Natal.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
" O Filho do Homem "
Poemas, Sonetos e Baladas
*
VII
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas Oh! não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
" Rosa de Hiroshima "
Poema cantado pelo grupo brasileiro
"Secos e Molhados"
*
VIII
Oh! rosa que raivosa
Assim carmesim
Quem te fez zelosa
O carne tão ruim?
-
Que anjo ou pássaro
Roubou tua cor
Que ventos passaram
Sobre o teu pudor
-
Coisa milagrosa
De rosa de mate
De bom para mim.
-
Rosa glamourosa?
Oh! rosa que escarlate:
No meu jardim!
*
VINÍCIUS DE MORAIS
" O Escândalo da Rosa "
Poemas Sonetos e Baladas.
*
IX
Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida, eu vou te amar
Em cada despedida, eu vou te amar
Desesperadamente, eu sei que vou te amar.
-
E cada verso meu será
Pra te dizer, que eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida
Eu sei que vou chorar.
-
Em cada ausência tua, eu vou te amar
Mas cada volta tua há de apagar
O que ausência tua me causou.
-
Eu sei que vou sofrer, a eterna desventura de viver
À espera de viver ao lado teu.
Por toda a minha vida.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
"Eu sei que vou te Amar"
Letra de música de "Bossa-Nova"
*
"Bem-te-Vi"
Aves do Brasil.

X
Para que vieste
Na minha janela
Meter o nariz?
Se foi por verso
Não sou mais poeta
Ando tão feliz!
Se é para uma prosa
Não sou Anchieta
Nem venho de Assis.
-
Deixa-te de histórias
Some-te daqui!
*
VINÍCIUS DE MORAIS
" A um Passarinho "
*
XI
Por seres quem me fostes, grave e pura
Em tão doce surpresa conquistada
Por seres uma branca criatura
De uma brancura de manhã raiada.
-
Por seres de uma rara formosura
Malgrado a vida dura e atormentada
Por seres mais que a simples aventura
E menos que a constante namorada.
-
Porque te vi nascer, de mim sozinha
Como a noturna flor desabrochada
A uma fala de amor, talvez perjura.
-
Por não te possuir, tendo-te minha
Por só queres tudo, e eu dar-te nada
Hei de lembrar-te sempre com ternura.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
" Soneto de Quarta-Feira de Cinzas "
Poemas Sonetos e Baladas
*
XII
Hoje é sábado , amanhã é domingo
A vida vem em ondas, como o mar
Os bondes andam em cima dos trilhos
E Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na cruz para nos salvar.
-
Hoje é sábado, amanhã é domingo
Não há nada como o tempo para passar
Foi muita bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo
Mas por via das dúvidas livrai-nos meu Deus de todo mal.
-
Hoje é sábado, amanhã é domingo
Amanhã não gosta de ver ninguém bem
Hoje é que é o dia do presente
O dia é sábado.
-
Impossível fugir a essa dura realidade
Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios
Todos os namorados estão de mãos entrelaçadas
Todos os maridos estão funcionando regularmente
Todas as mulheres estão atentas
Porque hoje é sábado.
**
Neste momento há um casamento
Porque hoje é sábado
Há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado
Há um homem rico que se mata
Porque hoje é sábado
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado
Há um espetáculo de gala
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado
Há um grande espírito de porco
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado
Há criancinhas que não comem
Porque hoje é sábado
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado
Há uma tensão inusitada
Porque hoje é sábado
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado
Há um noivo louco de ciúmes
Porque hoje é sábado
Há um "garden-party" na cadeia
Porque hoje é sábado
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado
Há um frenesi de dar banana
Porque hoje é sábado
Há a sensação angustiante
Porque hoje é sábado
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado
Há comemoração fantástica
Porque hoje é sábado
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado
E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado
Há a perspectiva do domingo
Porque hoje é sábado . . .
*
VINÍCIUS DE MORAIS
Fragmento de "Dia da Criação"
*
XIII
O meu amor sozinho
É assim como um jardim sem flor
Só queria poder ir dizer a ela
Como é triste se sentir saudade
É que eu gosto tanto dela
Que é capaz dela gostar de mim
E acontece que eu estou mais longe dela
Que da estrela a reluzir na tarde
Estrela, eu lhe diria
Desce à terra, o amor existe
E a poesia só espera ver
Nascer a Primavera
Para não morrer
Não há amor sozinho
É juntinho que ele fica bom
Eu queria dar-lhe todo o meu carinho
Eu queria ter felicidade
É que o amor é tanto
Um encanto que não tem mais fim
E no entanto ele nem sabe que isso existe
É tão triste se sentir saudade
Amor, eu lhe direi
Amor que eu tanto procurei
Ah, quem me dera eu pudesse ser
A tua Primavera
E depois morrer.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
"Primavera"
*
XIV
Vamos brincar, amor? Vamos jogar peteca
Vamos atrapalhar os outros, vamos sair correndo
Vamos subir no elevador, vamos sofrer calmamente e sem precipitação?
Vamos sofrer , amor? Males da alma, perigos
dores de má fama íntimas como as chagas de Cristo
Vamos, amor? Vamos tomar porre de absinto
Vamos toma porre de coisa bem esquisita, vamos
Fingir que hoje é domingo, vamos ver
O afogado na praia, vamos correr atrás do batalhão?
Vamos, amor tomar thé na Cavé com madame de Sevignée
Vamos roubar laranja, falar nome, vamos inventar
Vamos criar beijo novo, carinho novo, vamos visitar N.Sra. do Parto?
Vamos, amor? Vamos nos persuadir imensamente dos acontecimentos
Vamos fazer neném dormir, botar ele no urinol
Vamos amor?
Porque excessivamente grave é a Vida.
*
VINÍCIUS DE MORAES
"Amor"

*
XV
Amo-te tanto, meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.
-
Amo-te afim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.
-
Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.
-
E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.
*
VINÍCIUS DE MORAIS
"Soneto do Amor Total"
Antologia Poética

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