sexta-feira, 30 de abril de 2010

. . . a imagem, imaginária de um poeta . . . .


Foto "Orquideas" LuisD

*
Fonte dos Amores
*
Quando eu era menino
ouvi contar
uma história famosa e singular:
- trágica como o Destino,
mimosa como o beijo de donzela
e bela
como o raio de luar.
-

Era a história de Inês,

mulher e graça
de uma graça tão viva e perturbante,
que dominou de vez
os olhos e o cuidar do nobre infante,
exemplo de uma raça tão terna e veemente.
Que aprendeu a cantar
à luz do Sol nascente
e aprendeu a amar
eternamente
-História comovida,
essa história de Inês
sempre cheia de vida,
até à Eternidade,
no coração de cada português
que reza enternecido a oração
que se chama saudade?
-
Pedro e Inês são simbolo de amor
que a alma lusa canta e acarinha:
- romancede paixão de luto e dor . . .
. . . da que depois de morta foi rainha!
-
Ó Coimbra das trovas e baladas,
coração de Portugal
que vives, no chorar das guitarradas,
essa vaga de inquieta ansiedade
que vai desde o Penedo da Saudade
às águas marulhentas do Choupal!
-
Ó Coimbra de lendas e doutores
tão cheia de aventura e de beleza!
só tu podias ter,
a correr,
a Fonte dos Amores
que é tradição da alma portuguesa . . .
-
Ali, na antiga terra do Quissol,
entre sombras discretas do arvoredo
havia uma nascente
fonte de água corrente
onde dizem que um rouxinol
vinha cantar,
à luz do luar,
terno segredo . . .
-
E a popular versão,
desta mimosa teia de dulçores
criou um belo sonho de ilusão
a que chamou a Fonte dos Amores.
-
Pois contam que as raparigas
que pretendiam casar,
não julgavam ser erroneo
vir à fonte e lá cantar
as mais bonitas cantigas
na noite de Santo António.
-
Quando eu aqui cheguei ainda era
a Fonte dos Amores:
- uma réstia de Sol de Primavera,
entre sombras e flores,
que todos nós gostávamos de ver . . .
-
Os anos decorreram sem demora,
e agora,
da Fonte tão bucólica e tão bela
a romântica luz do Sol de Outono,
ficou uma saudade ao abandono
da fonte que não pára de correr . . .
-
. . . mas só eu falo dela.
*
AUGUSTO CERVEIRA BATISTA
"Fonte dos Amores"
( Mais Poemas . . . "Os Eternos Momentos de Poetas
e Pensadores da Lingua Portuguesa", pág. 175).
*
▬ Reflexão de Poeta, Pensador ▬
Ninguém sabe porque ama, ou porque não ama.
É uma coisa que se sente, mas não se explica . . .
Júlio Dinis
▬ Aniversários Importantes ▬
Mia Couto- 05 de julho de 1955.
Henriqueta Lisboa- 15 de julho de 1904.
Mário Quitanda- 30 de julho de 1906 . . .

"Arte",LuisD.

*
Poema para Garrincha
*
AVE! GARRINCHA
-
Ave humana
lépida
discreta
pés de brisa
corpo dúbio
finta certa.
-
GARRINCHA é como a aragem
GARRINCHA é como o vento
GARRINCHA é como a brisa
-
que ora avança
na cancha
com graça
e elegância
e rebate
o arremesso
e remata
no peito
e rechaça
a ameaça
da caça
que o caça
e enfim a embaraça
no drible-trapaça
que a prostra no chão
pés de brisa
corpo dúbio finta certa.
-
GARRINCHA é a ave
certa de seu vôo
GARRINCHA é a seta
certa de seu alvo
GARRINCHA é o homem
certo de sua meta.
-
tendo as pernas curvas
e uma candura esquiva
no teu silêncio puro
a tua alma asinha
sabe sofrer na neve
o frio da andorinha.
-
GARRINCHA
ave incontida
e mal retida
nas gaiolas
do gramado
-
com endiabrados
dribles e disparos
com diabices raras
sobre a cancha
"Arte", LuisD.
-
Avança
a dança
e pula
e aduba
e açula
a alma do infeliz
que o perseguiu:
parou
pisou
passou
voltou
driblou
chutou
- GOL DO BRASIL
pés de brisa
corpo dúbio
finta certa
GARRINCHA dora avante
é ave nacional.
*
AFFONSO ROMANO DE SANT'ANA
"Poema para Garrincha"
A Palavra
(Mais Poemas . . ."Os Eternos Momentos de Poetas e
Pensadores da Lingua Portuguesa", pág. 168).
*
II
Minúcia de"Futebol" Pintura de Portinari,
pintor brasileiro
"Momento Feliz"
Copa do Mundo de 70
*Com o arremesso das feras
e o cálculo das formigas
a seleção avança
negaceia
recua
envolve.
É longe e em mim.
Sou o estádio de Jalisco, triturado
de chuteiras, a grama sofredora
a bola mosqueada e caprichosa.
Assistir? Não assisto. Estou jogando.
-
No baralho de gestos, na maranha
na contusão da coxa
na dor do gol perdido
na volta do relógio e na linha de sombra
que vai crescendo e esse tento não vem
ou vem mas é contrário . . . e se renova
essa lenta lesma de Replay.
Eu não merecia ser vaiado
por esse tiro frouxo sem destino.
Meus onze atletas
são onze meninos fustigados
por um deus fútil que comanda a sorte.
É preciso lutar contra o deus fútil
fazer tudo de novo; formiguinha
rasgando seu caminho na espessura
do cimento do muro.
-
Então crescem os homens. Cada um
é toda a luta, sério. E é todo arte.
Uma geometria astuciosa
aérea, musical,de corpos sábios
a se entenderem, membros polifônicos
de um corpo só, belo e suado. Rio,
rio de dor feliz, recompensada
com TOSTÃO a criar e JAIR terminando
a fecunda jogada.
-
É GOOOOOOOOOOL na garganta florida
rouca exauta, gol no peito meu aberto
gol na minha rua nos terraços
nos bares nas bandeiras nos morteiros
GOL
na girandolarrugem das girândolas gol
na chuva de papelzinhos celebrando
por conta própria no ar: cada papel,
riso de dança distribuido
pelo país inteiro em festa de abraçar
é gol legal é gol natal é gol de mel e sol
-
Ninguém me prende mais, jogo por mil
jogo em PELÉ o sempre rei republicano
o povo feito atleta na poesia
do jogo mágico.
Sou RIVELINO a lâmina do nome
cobrando, fina, a falta.
Sou CLODOALDO rima de EVERALDO
Sou BRITO e a sua viva cabeçada
com GERSON e PIAZZA me acrescento
de forças novas. Com orgulho certo
me faço capitão CARLOS ALBERTO
FÉLIX, defendo e abarco
em meu abraço a bola e salvo o arco.
-
Como foi que esquentou assim o jogo?
Que energias dobradas afloraram
do banco de reservas interiores?
Um rio passa em mim ou sou o mar atlântico
passando pela cancha e se espraiando
por toda a minha gente reunida
num só video, infinito, num ser único?
-
De repente o BRASIL ficou unido
contente de existir, tricando a morte
o ódio, a pobreza, a doença o atraso triste
por um momento puro de grandeza
e afirmação no esporte.
"Vencer com honra e graça
com beleza e humildade
é ser maduro e merecer a vida,
ato de criação ato de amor"
A ZAGALO, zagal prudente,
e a seus homens de campo e bastidor
fica devendo a minha gente
este minuto de felicidade.
*
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
"O Momento Feliz"
COPA DO MUNDO 70
Versiprosa
(Mais Poemas . . ."Os Eternos Momentos de Poetas e
Pensadores da Lingua Portuguesa" pág. 90).
*
Reflexão de Poeta, Pensador
Tenho em mim todos os sonhos do mundo . . .
Fernando Pessoa
▬ Aniversários Importantes ▬
Alda Lara - 09 de junho de 1930
Fernando Pessoa - 13 de junho de 1888
Xanana Gusmão - 20 de junho de 1946
Machado de Assis - 28 de junho de 1836

"Arte", LuisD.

MÃOS
*

Mãos sem aneis, mãos frias de mendiga

Mãos que pedem esmola,

mãos viúvas de beijos, de balada antiga,
fanadas a rezar e que ninguém consola . . .
-
Mãos de perdão e triste como as cruzes
que ouvem o mar nas rochas silenciosas . . .
Mãos que fogem do Sol, dos astros e das luzes
e vão pelas penumbras a afagar as rosas . . .
-
Mãos de piedade sobre o meu cabelo,
mãos de mistério sobre a minha boca
mãos em que dormem minhas mãos de gelo,
mãos que são amas da minha alma louca . . .
-
Mãos para o berço, para a cabeceira
d'almas que vão morrer ainda evocando,
mãos doces de criança e de enfermeira,
mãos que dizem adeus abençoando . . .
-
Mãos que têm gestos tristes d'embalar
e sem ninguém que reze a Deus por elas,
mãos d'orgão, mãos ingénuas sempre a errar,
como os pobres, as asas e as velas . . .
-
Mãos que sofrem a dor dos corações sózinhos
que a morte d'algum sonho desgraçou . . .
Mãos precoces que vão no lívidos caminhos
colhendo cardos que o luar gelou . . .
-
Mãos que às tardes de cinza vêm beijar-me
quando a minha alma morre de cansaço,
mãos que eu invoco pálido d'alarme
quando o Sol ri de mim pelo céu baço . . .
-
Mãos de esquecidas, mãos sacrificadas
a abençoar a vida que as tortura . . .
Mãos pequeninas, mãos martirizadas
e sem destino pela noite escura . . .
-
Minha alma ajoelha se vos beijo
e rezo dentro em mim ave-marias . . .
ó berço em que dorme, meu desejo,
dormi no meu cabelo, ó mãos esguias!
*
ANTÓNIO PATRICIO
"Mãos"
Oceano
*
Reflexão de Poeta, Pensador ▬
Vale a pena viver
nem que seja para dizer
que não vale a pena . . .
*
MÁRIO QUINTANA

▬ Aniversários Importantes ▬
Manuel Alegre - 12 de maio de 1936.
Murilo Mendes - 13 de maio de 1901.
José Craveirinha - 28 de maio de 1922.



















quinta-feira, 1 de abril de 2010

. . . a imagem imaginária de um poeta . . .

*

"Arte", LuisD.
Soneto XIII
*
-"Ora(direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso! Eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido espanto . . .
-
E conversamos toda noite, enquanto
A Via-Láctea, como um pálido aberto,
Cintila. E, ao vir do Sol, saudoso e em pranto.
Inda as procuro pelo céu deserto.
-
Direis agora:- Tresloucado amigo!
que conversa com elas? Que sentido
tem o que dizem, quando estão contigo?"
-
E eu vos direi:- "Amai para entendê-las!
pois só quem ama pode ter ouvido
capaz de ouvir e de entender estrelas".
*
OLAVO BILAC
"Soneto XIII"
Via Láctea
(Mais Poemas . . ."Os Eternos Momentos de Poetas e
Pensadores da Lingua Portuguesa", pág. 85).
▬ Reflexão de Poeta, Pensador ▬
. . . nesse desesperado esforço dos vivos,
para ver o que é invisível e compreender
o que é incomprensível . . .
*
Monteiro Lobato