quinta-feira, 30 de abril de 2009

149 - " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "

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ANTÓNIO PATRÍCIO
Nasceu a 07 de março de 1878, signo de peixes,
Porto, Portugal. . .
Poeta...
Faleceu 04 de junho de 1930.
*
CANTOePALAVRAS
Oceano, 1905; Fim (teatro), 1909; Serão Inquieto
(contos), 1910; Pedro e Crú (teatro), 1919;
D. João e a Mascara (teatro), 1924;
Poesias (póstuma), 1942 . . .

Pintura "Regedor" pintor Malhoa
(detalhe das mãos).
I
Mãos sem anéis, mãos frias de mendiga,
mãos que pedem esmola,
mãos viúvas de beijos, de balada antiga.
fanadas a rezar e que ninguém consola . . .
-
Mãos de perdão e triste como as cruzes que ouvem o mar nas rochas silenciosas . . .
Mãos que fogem do Sol, dos astros e das luzes
e vão pelas penumbras a afagar as rosas . . .
-
Mãos de piedade sobre o meu cabelo,
mãos de mistério sobre a minha boca
mãos em que dormem minhas mãos de gelo,
mãos que são amas da minha alma louca . . .
-
Mãos para o berço, para a cabeceira
d'almas que vão morrer ainda evocando,
mãos doces de criança e de enfermeira,
mãos que dizem adeus abençoando . . .
-
Mãos que têm gestos tristes d'embalar
e sem ninguém que reze a Deus por elas,
mãos d'orgão, mãos ingénuas sempre a errar,
como os pobres, as asas e as velas . . .
-
Mãos que sofrem a dor dos corações sózinhos
que a morte d'algum sonho desgraçou . . .
Mãos precoces que vão nos lívidos caminhos
colhendo cardos que o luar gelou . . .
-
Mãos que às tardes de cinza vêm beijar-me
quando a minha alma morre de cansaço,
mãos que eu invoco pálido d'alarme
quando o Sol ri de mim pelo céu baço . . .
-
Mãos de esquecidas, mãos sacrificadas
a abençoar a vida que as tortura . . .
mãos pequeninas, mãos martirizadas
e sem destino pela noite escura . . .
-
Minha alma ajoelha se vos beijo
e rezo dentro em mim ave-marias . . .
ó berço em que dorme, meu desejo,
dormi no meu cabelo, ó mãos esguias!
*
ANTÓNIO PATRICIO
"Mãos"
Oceano
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ANTÓNIO GEDEÃO
Rômulo de Carvalho
Nasceu a 24 de novembro de 1906, signo de sagitário.
Lisboa, Portugal.
Poeta, formou-se em Ciências Físico-Químicas, no Porto. . .
Agraciado, com "Grã-Cruz da Ordem de Sant'iago
de Espada" (1996). . .
*
CANTOePALAVRAS
Movimento Perpétuo, 1956; Teatro do Mundo, 1958;
Máquina do Fogo, 1961. . .
*
I
Todo o tempo é de poesia
Desde a névoa da manhã
À névoa do outro dia.
Desde a quentura do ventre
-
À frigidez da agonia.
Todo o tempo é de poesia.
Entre bombas que defragam.
Corolas que se desdobram.
-
Corpos que em sangue sossobram.
vidas que a amar se consagram.
Sob a cúpula sombria
-
Das mãos que pedem vingança.
Sob o arco da aliança
Da celeste alegoria.
-
Todo o tempo é de poesia.
Desde a arrumação do caos
À confusão da harmonia.
*
ANTÓNIO GEDEÃO
"Tempo de Poesia"
Movimento Perpétuo

II
Meu pratinho de arroz doce
Polvilhado de canela;
Era bom mas acabou-se
desde que a vida me trouxe
outros cuidados com ela.
-
Eu, infante, não sabia
as magoas que a vida tem.
Ingênuamente sorria,
me aninhava e adormecia
no colo da minha mãe.
-
Soube depois que há no mundo
umas tantas criaturas
que vivem num charco imundo
arrancando arroz do fundo
de pestilentas planuras.
-
Um Sol de aresta pastosas
cobre-os de cinza e de azêbre
à flor das águas lodosas,
eclodindo em capciosas
intermitências de febre.
-
Já não tenho o teu engôdo,
Ó mãe, nem desejo tê-lo.
Prefiro o charco e o lôdo.
Quero o sofrimento todo.
Quero senti-lo, e vencê0lo.
*
ANTÓNIO GEDEÃO
"Dor de Alma"
Teatro do Mundo





150 - José Saramago " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "


JOSÉ SARAMAGO
José de Sousa Saramago
Nasceu a 16 de novembro de 1922, signo de escorpião,
Azinhaga, Golegão, província do Alentejo, Portugal.
Poeta, escritor, jornalista, dramaturgo, romancista . . .
político . . . serralheiro mecânico(!!!) desenhista . . .
Colaborou na Revista "Seara Nova". "Associação
Portuguesa de Escritores"; "Diário de Notícias";
Diário de Lisboa", Portugal. Fundador da "Frente
Nacional para a Defesa da Cultura" (F.N.D.C.).
Homenagens: Premio "Associação de Críticos
Portugueses", 1979; Premio "Cidade de Lisboa",
1980; Premio "PEN, Clube Português", 1982 e 1984;
Premio "Literário Município de Lisboa", 1982;
Premio "D. Dinís", 1986; Premio "Cinzane-Cavour"
Itália, 1987; Premio Internacional "Ennio Flaiano", 1992;
Premio do Jornal "Independent", 1993; Premio
Internacional Literário "Mondello" Itália, 1992; Premio
Literário "Brancatti", Itália, 1992; Premio "Vida Literária"
Associação Portuguesa de Escritores(A.P.E.), 1993;
Premio Consagração" Sociedade Portuguesa de Autores
(S.P.A.), 1995;
Premio Camões, 1995;
Premio "Nobel de Literatura", Real Academia Sueca,
08 de outubro, de 1998 . . .
*
CANTOePALAVRAS
Tema do Pecado (romance), 1947; Os Poemas Possíveis,
1966; Provavelmente Alegria (poesia), 1970; O Ano de 1993
(poesia), 1975; Deste Mundo e do Outro (crônicas), 1971;
A Bagagem do Viajante (crônica), 1973; Os Apontamentos,
1976; Manual de Pintura e Caligrafia, 1977; Objeto Quase,
1978; Poético dos Cinco Sentidos - O Ouvido (conto),
1979; A Noite (teatro), 1979; Levantado do Chão (romance),
1980; Que Farei com este Livro? (teatro),1980; Viagem a
Portugal, 1981; Memorial do Convento (romance), 1982;
O Ano da Morte de Ricardo Reis (romance), 1984;
A Jangada de Pedra (romance)1986; História do Cerco de
Lisboa, 1989; O Evangelho Segundo Jesus Cristo (romance),
1991; Ensaio sobre a Cegueira (romance), 1995;
Todos os Nomes(romance),1997; A Caverna(romance), 2000;
O Homem Duplicado (romance), 2002; Ensaio Sobre a
Lucidez (romance), 2004; As Intermitências da Morte
(romance), 2005; A Viagem do Elefante (romance), 2008;
Caim (romance), 2009 . . .
*
I
Não direi:
Que o silêncio me sufoca e amordaça.
Calado estou, calado ficarei,
Pois que a língua que falo é doutra raça.
-
Palavras consumidas se acumulam,
Se represam, cisterna de águas mortas,
Ácidas mágoas em limos transformadas,
Vasa de fundo em que há raízes tortas.
-
Não direi:
Que nem sequer o esforço de as dizer merecem,
Palavras que não digam quanto sei
Neste retiro em que me não conhecem.
-
Nem só lodos se arrastam, nem só lamas,
Nem só animais boiam, mortos, medos,
Túrgidos frutos em cachos se entrelaçam
No negro poço de onde sobem dedos.
-
Só direi:
Crispadamente recolhido e mudo,
Que quem se cala quanto me calei
Não poderá morrer sem dizer tudo.
*
JOSÉ SARAMAGO
"Poema a Boca Fechada"
Os Poemas Possíveis
*
II
Se não tenho outra voz que me desdobre
Em ecos doutros sons este silêncio,
É falar, ir falando, até que sobre
A palavra escondida do que penso.
-
É dizê-la, quebrado, entre desvios
De flecha que a si, mesma se envenena,
Ou mar alto coalhado de navios
Onde o braço afogado nos acena.
-
É forçar para o fundo uma raiz
Quando a pedra cabal corta caminho,
É lançar para cima quanto diz
Que mais árvore é o tronco mais sozinho.
-
Ela dirá, palavra descoberta,
Os ditos do costume de viver:
Esta hora que aperta e desaperta,
O não ver, o não ter, o quase ser.
*
JOSÉ SARAMAGO
"Se não Tenho Outra Voz . . ."
Os Poemas Possíveis
*
III
De paisagens mentirosas
De luar e alvoradas
De perfumes e de rosas
De vertigens simuladas
Que o poema se desnude
De tais roupas emprestadas
Seja seco seja rude
Como pedras calcinadas
Que não fale em coração
Nem de coisas delicadas
Que diga não quando não
Que não finja mascaradas
De vergonha se recolha
Se as faces sentir molhadas
Para seus gritos escolha
As orelhas mais tapadas
E quando falar de mim
Em palavras amargadas
Que o poema seja assim
Portas e ruas fechadas
-
Ah que saudade do sim
Nestas rimas desoladas.
*
JOSÉ SARAMAGO
"Dia Não"
Os Poemas Possíveis
*
IV
Poeta não é gente, é bicho coisa
Que da jaula ou gaiola vadiou
E anda pelo mundo às cambalhotas,
Recordadas do circo que inventou.
-
Estende no chão a capa que o destapa,
Faz do peito tambor, e rufa, salta,
É urso bailarino, mono sábio,
Ave torta de bico e pernalta.
-
Ao fim toca a charanga do poema,
Caixa, fagote, notas arranhadas,
E porque bicho é, bicho lá fica,
A cantar às estrelas apagadas.
*
JOSÉ SARAMAGO
"Circo"
Os Poemas Possíveis





151 - " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "




LUÍS AMARO
Francisco Luís Amaro
Nasceu a 05 de maio de 1923, signo de touro,
em Aljustrel, Portugal.
Poeta, escreveu para várias revistas "Portucale",
"Távola Redonda" e outras. . .


CANTOePALAVRAS
Dádivas, 1949; Diário Íntimo, 1975. . .

I Um silêncio, um olhar, uma palavra:
Nasceste assim na minha vida,
Inesperada flor de aroma denso,
Tão casual e breve. . .

Já te visionara no meu sonho,
Imagem de segredo, esparsa ao vento
Da noite rubra, delicada, intacta.
E pressentira teu hálito na sombra
Que minhas mãos desenham, inquietas.

Existias em mim. O teu olhar
Onde cintila, pura, a madrugada,
Guardara-o no meu peito, ó invisível,
Flutuante apêlo das raízes
Que teimam em prender-te, minha vida!
*
LUÍS AMARO
"Retrato"
Revista "Árvore"
Diário Íntimo
*
II
Um fio de música
Que me liberte
Do peso escuro
Que trago em mim!
-
Um fio de música
Que me transmita
(E a alma inunde),
Mãe, teu perdão!
-
Um fio de música
Que vá ao fundo
Do ser dorido,
Qual uma benção,
-
E sagre e embale
Meu coração
Das trevas preso:
Um fio de luz
-
que me redima
Daquele instante
E varra, afaste
A vil lembrança.
-
Um fio de música
A dar-me o alento
De olhar de frente
A luz do dia!
*
LUIS AMARO
"Um Fio de Música"
Diário Íntimo
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FRANCISCO BUGALHO
Francisco José Lahmeyer Bugalho
Nasceu em 26 de julho de 1905, signo de leão,
cidade do Porto, Portugal.
Poeta, doutorou-se em Direito na Universidade
de Lisboa . . .
Faleceu 29 de janeiro de 1949.
*
CANTOePALAVRAS
Margens, 1931; Canções de Entre Céu e Terra, 1940;
Paisagem, 1947 . . .
*
Estes ceifeiros não são
Os ceifeiros do Fialho.
Têm braços, mãos, almas duras,
Têm fogo no coração,
Têm amor ao seu trabalho,
Por ser trabalhar no pão.
-
Estes ceifeiros não são
Grilhetas, são orgulhosos
De darem, ao mundo, pão;
Porque são eles que o dão
A pobres ou poderosos.
-
Está hoje vento suão.
Está quente, - oh, gentes! Está quente!
Vamos lá, outro empurrão!
Não vá desgranar-se o grão . . .
- E a fila marcha prá frente.
-
Range o restolho cortado,
Pela serrilha da foice,
E aquele mar ondulado,
Que foi lindo mar doirado,
Não tem espiga que baloice.
-
Quando a gente está afeito,
Quase não sente o calor.
Cortar o pão quer-se feito
Co'a ternura, gosto e jeito
Com que se fala de amor.
-
A espiga está grada e bela.
O Inverno ainda vem longe.
E, nesta vida singela,
Ter pão é estar à janela
E poder olhar pra longe.
-
Estes ceifeiros não sabem
Mais que a vida natural.
Mas têm a intuição que cabem,
Às mãos que esta faina acabem,
Dons do sobrenatural.
*
FRANCISCO BUGALHO
"Ceifeiros"
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RAUL FERRÃO
Nasceu em 25 de outubro de 1890, signo de escorpião.
Santos-o-Velho, Lisboa, Portugal.
Professor, poeta, compositor, militar, engenheiro químico . . .
um dos fundadores da "Sociedade Portuguesa de
Autores", escreveu para filmes, teatros, operetas e fados . . .
Faleceu 30 de abril de 1953.
*
CANTOePALAVRAS
Fados os mais famosos "O Cochicho", "Maria Severa",
"Lisboa não sejas Francesa", Coimbra . . .
*
Num beco da Mouraria
onde a alegria
do Sol não vem
morreu Maria Severa
sabem quem era?
Talvez ninguém.
-
Uma voz sentida e quente
que hoje à terra disse adeus
voz sentida, mas ardente
mas que vive eternamente
Dentro em nós e junto a Deus
alem nos céus.
-
Bem longe o luar
no azul tem mais luz
Eu vejo-a rezar
aos pés de uma cruz.
Guitarras trinai
viradas ao céu.
Fadistas chorai
porque ela morreu.
-
Caía a noite na viela
quando o olhar dela
deixou de olhar
partiu p'ra sempre, vencida
cantando à vida
que a fez chorar.
-
Deixa um filho idolatrado
de outro afeto igual não tem
chama-se ele o triste fado
que vai ser desse enjeitado?
Se perdeu o maior bem:
O Amor de Mãe.
*
RAUL FERRÃO
"Maria Severa"
Fado
Raul Ferrão & José Galhardo
(cantado, por Alberto Ribeiro, 1947, no
filme "Capas Negras")
(Mais Poemas . . . "Donde Borbota, Minha Saudade " . . .
Pág. 193).
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GOMES DE AMORIM
Francisco Gomes de Amorim
Nasceu a 13 de agosto de 1827, signo de leão.
Em Avelomar, Norte de Portugal.
Poeta, vida muito complexa por problemas políticos, do pai,
viaja para o Brasil mora no Amazonas, escreve para
Almeida Garrett, depois de ler a poesia "Camões", torna-se
amigo de Garrtett, depois que viaja de volta para Portugal, que na
realidade é seu protetor e amigo.
trabalha para jornais, e revistas.
Faleceu, a 04 de novembro de 1891.
*
CANTOePALAVRAS
Cedro Vermelho(teatro), 1856; Fígado de Tigre(teatro), 1857;
Aleijões Sociais(teatro), 1860; Efêmeros, 1866;
Viúva(comédia), 1870; Frutos de Vário Sabor(conto), 1876;
As Duas Fiandeiras, 1881 . . .
*
Eram horas de jantar, e o calor convidava a procurar as
sombras dos arvoredos. Cada rancho foi para seu lado, e em
breve as matas e bosques circunvizinhos se povoaram de alegres
romeiros e de encantadoras romeiras.
Era vistosíssimo o quadro: os trajos variadíssimos e de
terra, sob as abóbodas de verdura. A população de muitas
aldeiase vilas achava-se ali reunida, fraternalmente, comendo
sobre a relva. Numerosos carros, cada um com sua pipa de
vinho, espalhados pelo imenso arraial, forneciam a matéria-prima . . .
para a parte principal da romaria.
fontes de água deliciosa ofereciam ais mais sóbrios os seus
límpidos cristais. Ao pé do adro, tocava ruidosa filarmônica
de Braga ou de Barcelos. De todos os lados se ouviam
cantigas ternas e apaixonadas, casando-se com os sons das
violas e das rabecas. Maria Rosmaninha gozava, desde muito,
a fama de cantadora insigne. Apenas os da sua companhia
acabaram de jantar, pediram-lhe os rapazes, que folgavam de
ouvi-la, para que cantasse algumas cantigas.
Pedro de Laundes largou o pau no chão, pôs-se em pé,
encostado ao majestoso carvalho que os defendia do Sol, e
afinou a rabeca.
A Rosmaninha dispunha-se já para começar a cantar,
quando soou ao longe voz melancólica, entoando esta cantiga:
-
Das filhas que meu pai teve
Eu fui a mais infeliz;
As minhas irmãs casaram,
Só a mim ninguém me quis!
Todas as moças do rancho olharam umas para as outras;
e a Rosmaninha ficou muda. A voz saudosa continuou, em
tom ainda mais apaixonado que da primeira vez:
-
Ando triste como a noite;
Nada me alegra o sentido.
Ninguém sabe o bem que perde,
Senão depois de perdido . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Rosa branca, toma cor;
Não andes tão desmaiada;
Que eu assim mesmo te quero,
Mais do que à rosa encarnada.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Não sou roseira, nem rosa,
Nem urze, nem alecrim;
Nem cara que meta medo
A quem já chorou por mim.
-
O moço carpinteiro replicou logo:
Menina do chapéu alto,
Repare bem no que diz;
Porque toda a gente sabe
Que não fui eu quem a não quis.
Maria, sentindo-se ferida e quase humilhada pela insolente
declaração, replicou, todavia:
Nunca no mar faltam peixes,
Nem na terra faltam flores,
Nem no céu faltam estrelas,
Nem me hão de faltar amores.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Olhos pretos matadores,
Por que vos não confessais
Das mortes que tendes feito
Ao corações que roubais?
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Se os meus olhos dessem morte
Nunca nos teus poria;
Se eles fossem roubadores,
Bem sei quem eu roubaria.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Quem me dera ter a dita
Do chapéu que tens na mão,
Para andar sempre contigo,
Perto do teu coração.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Chapéu de moeda de ouro
Ninguém o tem como eu;
Hei de amar a quem me ama,
Dar figas a quem mo deu.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Chapéu de moeda de ouro
Aqui está quem to comprou;
Mas com beijos e abraços
O teu corpo mo pagou.
*
GOMES DE AMORIM
"A Poesia atrai a Prosa"(fragmento)
As Duas Fiandeiras
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FERNANDO LEMOS
José Fernandes Lemos
Nasceu em 03 de maio de 1926, signo de touro.
Lisboa, Portugal.
Poeta, professor, pintor, fotografo, publicitário . . .
Estudou na "Sociedade Nacional de Belas Artes" de
Lisboa, Portugal. . .
Participou em várias "Bienais" em São Paulo, Brasil.,
onde mora. Exposições pelo Mundo . . .
Homenagens:
Prémio "IV Bienal de São Paulo", melhor desenhista
Nacional . . .
*
CANTOePALAVRAS
Teclado Universal, 1952;
Cá& Lá, 1985; Na Casca do Ovo,o princípio do
desenho Industrial, 2003 , , ,
*
Os que não têm pão
da vida inesgotável
cantam silêncio em prata nocturna
prata secreta da noite
vaga e fútil
das quimeras amorosas na noite.
-
Na noite das pratas
Das pratas roubadas ao senhor mais rico
Na vida dos pássaros
na fuga da vida falhada aos gritos
um grito na altura
no espaço
entre a morte
e o último vagão da vida.
-
Da vida dos pássaros
numa sombra que nunca se deixa apanhar
Na luz que nunca se deixa pintar
nem apagar mesmo no espelho
que te abraçou na tormenta
construída pelo lar fora
pelo lar dos pássaros
O fora do risco que escapou ao vento
e no picar nervoso do pássaro mais rico.
-
Um dos pássaros mais ricos
e os dois mil voltes dum fio
que pareceu em instantes
o risco entre o vento
e o picar nervoso do pássaro mais rico.
-
Nem o homem nem o diabo
nem a mulher
nem a labareda
Mas o fogo todo inteiro
a possibilidade inteira do fogo
a mão de fogo constante
inalteravelmente vermelho
irremediavelmente preso de amor aos dedos
sensualmente delicado em seus arabescos de monte.
-
No céu mais mudo do silêncio
sumir em chamas
para os pássaros tudo o que antes
fôra a fuga entre a vida dos pássaros.
-
No risco mais fino do silêncio
entre o palpitar do mundo
e a vida dos pássaros
arder muito simplesmente
em franca esperança
na dada medida do desejo de dentro
o dentro do fogo branco
o fogo branco desejo
arder na vida dos pássaros
arder em apenas a cair do vento
no risco mais fino do silêncio
entre o palpitar do desejo
e o silêncio que pertence aos pássaros.
-
A noite vai chegar ferida
é um uniforme
Tenhamos coragem para não a achar parecida
Porque é um uniforme medalhado a sangue.
-
Os homens para matar mudam de roupa
Os homens para fugir não se despem
Os uniformes aí estão cheios de gente sangrando
nas janelas da revolta em meio corpo
Nas boites e nos altares escorrendo sangue.
-
Os homens para sofrer mudam de roupa
e ficam com a mesma cara
Os homens jogam o ódio para pintar o sangue
e ganham as cidades atulhadas de vício
-
Há os que se esvaziam do sangue para ganhar o céu.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
*
FERNANDO LEMOS
"O silêncio é dos Pássaros"
Teclado Universal