sexta-feira, 24 de abril de 2009

160 - " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA"



ADOLFO SIMÕES MÜLLER
Nasceu a 18 de agosto de 1909, signo de leão.
Lisboa, Portugal.
Jornalista, poeta radialista . . .
Fundou a revista infantil "Papagaio", 1935.
Homenagens: Grande Prémio da Literatura Infantil
"Calouste Gulbenkian".
Faleceu a 17 de abril de 1989.
*
CANTOePALAVRAS
As Asas de Icaro, 1925; Históriazinha de Portugal, 1914;
A Primeira Volta ao Mundo, 1971; O Principe do Mar, 1984;
Meu Portugal, Meu gigante, 1987; Pica-Pau Sola, Sapato,
Rei e Rainha . . .
*
Tres gotinhas de água, um dia,
Puseram-se a murmurar
Sobre qual delas teria
Maior bem para contar.
-
Disse a primeira, vaidosa:
- Ninguém calcula o que valho,
Quando em pétala de rosa
Morro num beijo de orvalho.
-
Por esse afago de aurora,
Que a minha vida resume,
É que a rosa se evapora
No milagre do perfume.
-
A segunda gota avança,
Diz num arrolho de pomba:
- É à minha semenhança
Que a luz das pérolas tomba.
-
Moça na fonte, ao domingo,
É princezinha sem par,
Se em seu rosto, pingo a pingo,
Deixo o mais lindo colar . . .
-
Calam-se ambas. E a terceira,
Que o Sol doira numa réstea,
Cora toda, de maneira
Que é imagem da modéstia . . .
Quebram as outras o encanto:
- É chegada a tua vez!
-Eu sou lágrima de pranto . . .
Que valho ao pé de voces?
-
E acrescenta em som profundo:
- Vós as duas, com certeza;
Vindes deixar sobre o Mundo
A fortuna ou a riqueza.
-
Nada sou, pobre de mim,
Que só tenho coração!
Junto às flores dum jardim
Ou às jóias dum salão.
-
Cala-se a voz muito pura
E duma ternura imensa . . .
E logo desce da Altura
O clarão desta setença:
-
- Sois vós a gota mais rara
(Pérola e aroma também)
Quando correis pela cara
Vinda duns olhos de mãe!
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Desde então, se por um filho
O pranto aos olhos assoma,
As pérolas perdem o brilho
E as pérolas perdem o brilho
E as rosas perdem aroma.
*
ADOLFO SIMÕES MÜLLER
"A Conversa das Gotas de Água"
JOSÉ BLANC DE PORTUGAL
José Bernardino Blanc Portugal
Nasceu a 08 de março de 1914, signo de peixes.
Lisboa, Portugal.
Na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa,
doutorou-se em "Ciências Geológicas"
Meteorologista, Tradutor, Poeta . . . Critíco Musical,
em diversos jornais e revistas . . . morou no Brasil . . .
Homenagens: Prémio "Fernando Pessoa", 1960; Prémio
"Casa da Imprensa", 1965; Prémio "P.E.N.";
Comendador da "Ordem do Infante D. Henrique";
Medalha "Oskar Nobiling", Sociedade Brasileira de Língua
e Literatura . . .
Faleceu, 14 de maio de 2000.
*
CANTOePALAVRAS
Enéadas, 1959; Anticrítico, 1960; Parva Naturalia, 1960;
O Espaço Prometido, 1960; Odes Pedestres, 1965;
Descompasso, 1986; Quatro Novíssimos da Música Actual, 1962 . . .
*
I
O vento que passa no cinzento
Destas velhas árvores desnudadas
Dá-lhes:
Vida.
-
A chuva que me bate na vidraça
A alfinetar gemente a tristeza de hoje
Dá:
Vida.
-
O Sol ausente recordado
Oculto continua dando:
Vida.
-
Impossível, inciente é a existência.
Ciência não é o Sol, a água, o ar;
Ciência é:
Dar!
*
JOSÉ BLANC DE PORTUGAL
"Ciência"
O Espaço Prometido
*
II
¹Pitágoras e Haendel ouviram os martelos;
O delegado imperial cismou naquele vagido
Deixando cair o tubo de metal
Para determinar o nome do recém-nascido
-
(Nem sequer sabia o que ²Heródoto contou
De ³Psamético e sua procura
Do falar mais velho que no mundo houve . . .)
-
Hanahpú e Ixbalamqué andavam pela terra
E, p'ra do mar,
A ave do relâmpago deixara cair o osso
Para a trompa do trovão a chamar as chuvas.
-
Lègbá, eixo-do-mundo, a luz, o fogo, as cores
Eram unos dantes como hoje;
Doze ossos cairam na pele do leopardo;
O meu amigo Mabone
Exilado no sul há muitos anos
Num tronco outra vez goivava
A árvore, a ave e a serpente
Delas sabendo tanto
Como o estrangeiro que as comprará
No bazar da cidade
(Como bananas).
*
¹Pitágoras, filósofo e matemático grego, século VI a.c.;
Haendel(Georg Friedrich Haendel) compositor alemão,
século XVII.
²Heródoto, historiador , geografo grego, século V a.c..
³Psamético(Psametk I), farao egipcio, século VII a. c..
Hanahpú, Mitologia Maia, deus e guerreiro, irmão gemeo de
Ixbalanqué, filhos do deus Hun-Hunahpú e a jovem Ixquic.
Lègbá, vodum na África e Haiti, guardião dos templos.
Mabone, deus Celta do amor, também conhecido como Angus
Dia sagrado do paganismo, na religião Wicca.
*
JOSÉ BLANC DE PORTUGAL
"Ensinar os Ignorantes"
O Espaço Prometido
(Mais Poemas . . . "Os Eternos Momentos de Poetas e
Pensadores da Língua Portuguesa", pág. 15;
"O CANTO . . . do encanto das . . . PALAVRAS", pág. 189).
RUY BELO
Ruy de Moura Belo
Nasceu a 27 de fevereiro de 1933, signo de peixes
São João da Ribeira,Rio Maior, Portugal.
Estudou Direito na Universidade de Coimbra,1951 e
terminou em Lisboa, 1956 . . .
Direito Canônico, Universidade São Tomás de Aquino,
Roma, Itália, 1958.
Homenagens: Grande Oficial da "Ordem Militar de
Santiago da Espada"( homenagem póstumo), 1991;
Foi instituido o Prémio "Ruy Belo", 2009, em Rio Maior. . .
*
CANTOePALAVRAS
Aquele Grande Rio Eufrates, 1961; O Problema da
Habitação, 1962; Boca Bilingue, 1966; Homem de Palavras, 1969;
Transporte no Tempo, 1973; País Possível, 1973;
A Margem da Alegria, 1974; Toda a Terra, 1976;
Despeço-me da Terra da Alegria, 1978 . . .
*
I
deixa-me olhar pássaro real
a saltitar nesta tarde esquecida,
como uma clara afirmação da vida
mesmo pequeno esse teu corpo vale.
-
Que alguma coisa morre em cada qual
leio-o nessa cabeça ao alto erguida
mas tens a alegria extrovertida
de não sentir em ti o nosso mal.
-
Somos contemporaneos meu amigo
por isso posso conviver contigo
compartilhar o orgulho de estar vivo
-
Eu penso e tu não pensas é que é certo.
Tu a saltar e eu aqui tão perto
a pensar que da morte me não privo.
*
RUY BELO
"Meditação Magoada"
Homem de Palavras
*
II
Ver-te é como ter à minha frente o tempo
É tudo serem para mim estradas largas
Estradas onde passa o Sol poente
É o tempo parar e seu próprio duvidar mas sem pensar
Se o tempo existe se existiu alguma vez
e nem mesmo meço a devastação do meu passado.
*
RUY BELO
"Sem Titulo"

COUTO GUERREIRO
Miguel Couto Guerreiro
Nasceu em Vila Grândola, Portugal. . .
*
Entraram em contenda o SOL e o VENTO
Sobre qual tem mais força, mais alento.
Passava, nesse tempo, um caminhante.
Assentaram que havia de ser triunfante
O que tivesse forças que lhe bote
Dos ombros para fora o seu capote.
-
Fez o VENTO tal força que mostrava
Que já por esses ares lho levava;
Mas o dono às mãos ambas o sustenta;
Porém, foi tal a força da tormenta
Que ele já de sustê-lo desanima.
E, enrolando-se bem, deitou-se em cima.
O VENTO andou de roda, deu-lhe um jeito;
Deu-lhe outro; porém tudo sem efeito.
-
Entrou na empresa o SOL, mas sem violência;
Antes com mansidão e com clemência:
No meio de uma tal serenidade
Os raios tinham tanta actividade
Que já os não sofria o passageiro.
Chegou-se a um sombrio castanheiro,
O capote depôs, que o martiriza
A veste, e fica em mangas de camisa.
Com assombro do VENTO furioso,
Ficou, por manso, o SOL vitorioso.

COUTO GUERREIRO
"O Sol e o Vento"
Fábulas
ANTÓNIO PINHEIRO CALDAS
Nasceu 12 de novembro de 1824, signo de escorpião.
Cidade do Porto, Portugal.
Criou a Revista "Bardo". . .
*
CANTOePALAVRAS
Poesias . . .
*
É virgem risonha de negros cabellos,
Cahindo, em novellos, nos hombros de neve,
São per'las seus dentes se os labios de rosa
Da bôca formosa se agitam de leve.
-
O seio ondulante do jaspe mais puro
Se engasta, seguro, na fragil cintura;
Esbelta e mais linda que a linda palmeira,
É nunca fagueira d'extrema ventura.
-
Os olhos . . .que olhos! . . .scintillam, radiantes,
Quaes lumes distantes, dos ceus na saphira;
E a voz que desprende d'estranha harmonia
Semelha a magia d'extatica lyra!
-
Nas pregas trementes da verde roupagem,
Que, aos sopros d'aragem, se enlaçam, rugosas,
Envolve-os a virgem, alçando, nevada,
A fronte elevada, cingida de rosas.
-
E eu via apontar-me um futuro brilhante,
Dos gosos d'amante, bem farto, bem cheio!
Eu vi-a, e, largando meus vôos ao genio,
Subi-me ao proscenio d'um magico enleio!
-
Que mundos eu vira! que enlevos sonhara!
Que gosos gosara! que o diga quem sente
Na ancia amorosa do peito incendido,
A chamma, o brazido d'um fogo latente.
-
Que mundos eu vira! que enlevos sonhara!
Que gosos gosara! que o diga o que aspira
Erguer-se em transportes ao templo da Glória
Cantando «victoria» nos cantos da lyra.
-
Que o diga! . . .Não dizem! - Quem n'alma acalenta
A febre sedenta que gera a poesia,
Não conta os mil gosos d'um curto delírio,
Que, a par do martyrio, sua alma extasia . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Esp'rança! meu sonho, de ha muito, sonhado
No ceu encantado, que a mente me anceia . . .
Esp'rança! - não fujas - que ao teu mago aspeito,
O fogo, em meu peito, mais vivo se ateia!
*
ANTÓNIO PINHEIRO CALDAS
"A Esperança"
Poesias
(Mais Poemas . . ."Os Eternos Momentos de Poetas e
Pensadores da Língua Portuguesa", pág.15 e
"NEGRAS CAPAS . . .POETAS DE COIMBRA", pág. 182).
FRANCISCO OTAVIANO
Francisco Otaviano de Almeida Rosa
Nasceu a 26 de junho de 1825, signo de câncer.
Rio de Janeiro, Brasil.
Cursou Direito, na Faculdade de Direito, em
São Paulo, 1845. Jornalista, político . . .
Patrono da "Academia Brasileira de Letras".
Faleceu em 1889, Rio de Janeiro.
*
CANTOePALAVRAS
Cantos de Selma, 1872; Traduções e Poesias, 1881. . .
*
Quem passou pela vida em branca nuvem,
E em plácido repouso adormeceu;
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu;
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida, não viveu.
*
FRANCISCO OTAVIANO
" Ilusões da Vida "
MÁRIO BEIRÃO
Mário Pires Gomes Beirão
Nasceu 01 de maio de 1890, signo de touro.
cidade de Beja, Província do Alentejo, Portugal.
Poeta, advogado(doutorou-se na Universidade de Lisboa),
politico, maçon.
Amigo de Teixeira Soares, Afonso Lopes Vieira, desta
amizade surgiu a revista "Águia", participou
tambem da revista "Portucale". . .
Faleceu em 1965.
*
CANTOePALAVRAS
Cintra, 1912; O Último Lusiada, 1913; Ausente, 1915;
Lusitânia, 1917; Pastorais, 1923; A Noite Humana, 1928;
Novas Estrelas, 194o; Mar de Cristo, 1957;
O Pão da Cria, 1964; O Oiro e Cinza, 1964 . . .
*
I
Nas horas do poente
Os bronzes sonolentos
- pastores das ascéticas planuras -
Lançam este pregão ao soluçar dos ventos,
- a nuvem erradia,
- as penhas duras;
- que é dele, o eterno Ausente,
- cantor da nossa melancolia?
-
Nas tardes duma luz de intimo fogo,
Recendentes de tudo o que passou,
Eu próprio me interrogo:
- Onde estou? Onde estou?
E procuro nas sombras enganosas,
os fumos do meu sonho derradeiro.
-
Ventos, que novas me trazeis das rosas,
Que acendiam clarões no meu jardim?
-
Pastores, que é do vosso companheiro?
-
Saudades, minhas, que sabeis de mim?
*
MÁRIO BEIRÃO
"Na Infermidade da Morte de um Poeta"
Ausente
*
II
Chôros que o pó amassaram,
Odios, fel: maré que avança . . .
Foram mãos que me talharam:
Sou a estatua da Vingança!
-
Maltez! Meu nome é de guerra!
Ver-me é logo presentir
Que o vento sul se descerra:
. . . Já mirram searas de o ouvir.
-
É noite. Vou pelas eiras,
- Alma em fogo - deitar fogo
A searas, mêdas inteiras:
Abraso e assim desafogo!
-
Sou fera? Vá. que me domem!
- Vós-outros o que sereis?
Não sou fera, sou o Homem,
O Escravo firmando leis.
-
Meu sangue reza nas veias . . .
- Por quem reza ou fala ou chora?
Pelos que em terras alheias
Foram escravos outrora!
-
Ó bronzes que em suor, destino,
Fundistes aos soes de Julho,
Sou vosso: herdei de menino
Vergões na pele e no orgulho!
-
Escaldo a bocca nos pegos
- A agua é pôdre, exalta tifos . . .
Deliro: ha mortos, entrego-os
Á gula dos grifos:
-
Coveiro da propria raça!
Dôr de além-dôr! Ao que eu vim!
Grito e o medo me trespassa,
Acordo e fujo de mim!
-
Existo e ausento-me. Ha escuro
Na minha memoria:- em vão
Me interrogo e me procuro.
Sou realidade ou visão?!
-
Choro - e as lagrimas apagam
Pouco a pouco o meu delirio.
Meus olhos quedam-se, vagam . . .
Floresço em dôr e sou lirio.
-
E choro:- perdão! O que hei-de,
Que hei-de, oh Ceus, fazer de mim?
Quem tem nome, quem tem sêde,
Sendo Abel é já Caim.
-
Tenho fome e pão comigo,
Vou saciar-me e nasce o horror:
Pois de cada grão de trigo
Cae uma baga de suor!
-
Terras vermelhas, barrentas . . .
Se as revolvo, as minhas mãos
Veem humidas, sangrentas
Do sangue dos meus irmãos!
-
Nos montes ermos, ás tardes,
Trancam as portas - se as forço.
Cahem-me aos pés os covardes
Como estatuas de Remorso.
-
E ascendo ás regiões supremas
Ao alto, bem alto, ao cimo,
Quebro todas as algemas,
Não sou eu, sou Deus, redimo!
-
Revolvo as covas - os mortos
- Ao luar o vento sacode-os -
Vêm esqualidos, absortos
Em terra, em vermes, em odios:
-
Ricos, prostrae-vos: é a hora!
Sou Deus, esmago Satan:
Ha sangue: nasce uma aurora!
Nas almas é já manhã!
-
MÁRIO BEIRÃO
"A Epopeia dos Maltezes"
Águia(revista vol°.1)
-
III
A Jaime Cortesão
*
Silencioso . . . Outomno . . . Esphinges na agua . . . orando,
Pelo claustro da sombra a tarde oscila:
Já uma estrela, tremula, scintila,
E os rochedos são bruxos cogitando . . .
-
Cae bruma e sonho . . . o mar, como que arfando,
Sobe e desce, profundo. Paz tranquila,
Calam a voz os sons: de não ouvi-la
Os echos adormecem a seu mando . . .
-
Ocaso em quebra-luz. Sagrando ritos,
A tarde ajoelha: silenciosa prática . . .
Fluida, a penumbra esfuma o corpo aereo:
-
Oh! instante em que a luz reza "bemditos" . . .
A sombra unge o silencio . . . A tera é extactica . . .
Deus vive em nós: escuta-nos . . . Misterio!
*
MARIO BEIRÃO
"Crepusculo"
Águia(revista nº.1)
*
IV
Viver é confessar
A negação da Vida,
De sonho em sonho errar . . .
Viver é ser suicida.
-
Viver é sermos vãos,
Cegar fitando a luz,
Por nossas proprias mãos
Crucificar Jesus!
-
Morrer é ser perfeito;
Oh Noite redemptora,
Podesse eu em leito
Sonhar, rezando Aurora!
-
Podesse a Morte ouvir
Os mudos rogos meus:
Morrer é resurgir,
É sermos nós em Deus!
*
MARIO BEIRÃO
"Viver, Morrer"
"Águia"(revista nº.04)
ALFREDO BROCHADO
Alfredo Monteiro Brochado
Pedro Meneses(pseudónimo)
Nasceu em 03 de fevereiro de 1897, signo de aquário.
Amarante, Portugal.
Fundador da revista "Ícaro". fundada em Coimbra 1919,
junto com Cabral do Nascimento e Luís Vieira.
Homenagens: deu nome às ruas nas cidades do Porto e Amarante
"Alfredo Brochado" . . .
Estilo Modernismo.
Faleceu, 16 de maio de 1949.
*
CANTOePALAVRAS
Obra Poética; Bosque Sagrado . . .
*
I
As andorinhas que eu tive
ao pé de mim, em redor,
partiram, foram-se embora,
em busca de mais calor!
-
Andorinhas! Andorinhas!
Para onde iriam elas? . . .
que nunca mais as ouvi,
ao pé das minhas janelas!
-
E mal o Outono chegou,
- oh tardes do Céu em brasa -,
fez-se um silêncio profundo,
nos beirais da minha casa!
-
Seus ninhos jazem desfeitos!
Inverno! Desolação!
Cheias de frio lá foram . . .
Quem sabe se voltarão?! . . .
*
ALFREDO BROCHADO
"AS Andorinhas"
Tríptico(revista) Coimbra.
*
II
Tu me beijaste.
Naquela tarde eu era
Uma flor, na Primavera
Da vida
Quase perdida,
A pender da haste.
*
Chorei, chorei!
Lá fora o vento
Parecia um rei,
Mas um rei Lear de sofrimento!
-
Vinham da rua
Canções e mais canções.
Mas inda assim nenhuma era igual à tua,
Que as tuas falas lembram orações.
-
Deram Trindades!
Depois nós a sonhar
Deixámos entrar as saudades
Como num tapete de luar!
-
Oremos!
Não sei o que dissemos
Por essa tarde assim;
Mas o momento era tão brando
E a tarde era tão calma
Que eu me julguei sonhando
Ao longo dum quimérico jardim
Com os canteiros todos feitos de alma.
-
Era de prece a hora!
Eu dei-te as minhas mãos! Depois, Maria?! . . .
- Por entre os nossos beijos vinham lá de fora
Os soluços da tarde na agonia.
-
E nós rezámos!
Parámos
Nossos beijos de amor já quase a esmorecer.
Anoitecia sempre, e eu fiquei ao teu lado,
Pálido e cansado,
Vendo as estrelas uma a uma a aparecer!
-
Hora divina aquela!
Batiam na janela
Os raios de luar.
E eu disse-lhes que entrassem,
Que não tivessem medo e me afagassem
Para que tu também pudesses descansar!
-
E o luar entrou.
E desde então
O luar ficou
No meu coração.
-
Embalo-o tanto
Às vezes eu,
Que é de luar o meu pranto
E é de luar o meu Céu . . .
-
Ia anoitecendo cada vez mais!
Que hora aquela tão estranha e antiga!
E eu ia-te dizendo, sempre aos ais,
Sê sempre, sempre, muito minha amiga.
-
Foram tudo quimeras e quimeras!
E o luar ia entrando
Como um perfume que se vai alando,
Ressuscitando
Dentro de nós antigas Primaveras.
-
E eu disse num momento de transporte:
Jura por tudo, tudo que quiseres,
Que hei-de ser para ti até à morte
Como és tu para mim entre as mulheres.
-
Amor! Amor! Jura-me aqui
A esta luz do entardecer
Que nunca mais me hás-de esquecer
Como eu jamais me esquecerei de ti.
-
E tu juraste
E a aleluia fez-se ao meu redor,
E eu que tremia como débil haste
Já me sinto melhor!
-
Já tenho mais alegria,
Se é que alegria posso ter,
Desde que te ouvi naquele dia:
"Hei-de te amar até morrer".
-
Posso agora morrer! A vida é sempre assim!
Que já tenho, meu Deus, quem se lembre de mim.
*
ALFREDO BROCHADO
"Juramento"
Águia(revista)
*
III
Tombam as rosas, meu amor, é a hora
De Schumann, de Grieg, e de Mozart,
E nos teus olhos donde nasce a aurora,
Há violetas a desabrochar.
-
Tombam as rosas, meu amor, e, agora
Como elas vão tombando devagar . . .
Tombam as rosas, meu amor, lá fora,
Mas violetas só no teu olhar.
-
E, lentamente, numa voz magoada,
Tu cantas para mim uma balada,
De um rei menino D. Sebastião.
-
E o dia morre, meu amor, depois,
Ficamos tristes a sonhar os dois,
Enquanto as rosas tombam pelo chão.
*
ALFREDO BROCHADO
"Momento Musical"
Bosque Sagrado
PEDRO ANTÓNIO CORREIA GARÇÃO
Corydon Erymantheo(pseudonimo)
Nasceu a 29 de abril de 1724, signo de touro.
Lisboa, Portugal.
Estudou Direito, na Faculdade de Direito, da Universidade
de Coimbra, porém não concluiu.
Sua vida atribulada, chegou a ser preso a mando de Marquês de
Pombal.
Estilo Arcadio.
Faleceu 10 de novembro de 1772.
*
CANTOePALAVRAS
Obras Poéticas . . .(avulso)
-
I
Ó mil vezes feliz o que encerrado
Entre baixas paredes
O tormentoso Inverno alegre passa!
Que de um pequeno campo,
Que ele mesmo cultiva, se alimenta,
Apascentando as vacas,
Que da mão paternal sómente herdou
C'os dourados novilhos,
Enquanto sobre a terra se reclina,
Dormindo descansado,
Ao som das frescas águas dum regato,
Horrorosos cuidados
O não vêm perturbar no brando sono.
A sórdida cobiça
Lhe não faz conceber vastos projectos;
Não pensa, não intenta
Atravessar o cabo tormentoso,
Sofrer chuvas e ventos,
Ouvir roncar as denigridas ondas,
e ver na feia noite
Entre nuvens a lua ir escondendo
O macilento rosto,
Por ir comerciar c'os pardos indos
E chinas engenhosos.
A sede insaciável de riquezas
Não faz que exponha a vida
Nos desertos sertões às verdes cobras
E aos remendados tigres.
Ah! ilustre soeiro, doce amigo,
O ouro de que serve,
Se os anos vão correndo tão velozes?
Se a morte não consente
Que a enrugada e pálida velhice,
Com passos vagarosos
Nos venha coroar de niveas cãs?
O senhor opulento
Ao seu pobre vizinho encurte o campo,
Que alegre cultivava;
Levantando soberbos edifícios,
Arranque as oliveiras,
O choupo, que sustenta as roxas uvas,
Para ornar seus jardins
De estéril murta, de cheirosas plantas.
O campo que ondeava
Com as úteis e pálidas espigas,
Cubra de fresca sombra
Do espesso cedro, do frondoso louro.
Alegre vá passando
No seio das delícias e regalos.
Mas ah! que não adverte
Que as tres filhas da noite, as ímpias Parcas,
Girando os leves fusos,
Lhe acabam de filar os curtos dias.
Que a morte inexorável
Se chega ao rico leito em que descansa,
Mostrando-lhe entre sombras
A macilenta mão com que lhe pega.
Já entre mil angústias,
entre os frios suspiros que derrama,
Acaba a triste vida,
Que intentava gozar por longos anos.
Só tu, filha do céu,
Umpávida Virtude, não estranhas
O aspecto da morte.
*
PEDRO ANTÓNIO CORREIA GARÇÃO
"À Vida Rústica"
*
II
Se à sombra dos loureiros sempre verdes,
que nascem junto às águas de Aganipe,
Inda, amigo, te encostas sossegado:
Se das soltas correntes, que do cume
Do frondoso Parnaso então caindo,
Por entre frias e musgosas pedras,
Sem nunca te fartares, ainda bebes:
Se as graciosas Musas te rodeiam,
Encosta a curva lira sobre o peito,
As àureas cordas fere, escreve, ó Olino.
Se a rima, como escravo te traz preso,
Perdida a liberdade, ao duro cepo,
Quebra as fortes cadeias; não é justo
que o contínuo zum-zum do consoante,
que o ouvido agita só, a alma não,
Esfrie o fogo que na ideia nasce.
Não busques pensamentos esquisitos,
Em denegridas nuvens embrulhados;
Não tragas, não metáforas violentas,
Imitando esse corvo do Mondego,
Que entre os cisnes do Tejo anda grasnando:
Usa da pura língua portuguesa,
Que aprendido já tens no bom Ferreira,
No Camões imortal, em Sousa e Barros:
Em grego não me escrevas, nem latim;
Dá-me conta da tua larga vida:
Desejo que me digas se inda presa
No pensamento trazes a cachopa;
Se com tres companheiros, numa banca,
De pano verde ornada, Whist jogas;
Se ouves falar francês; e se inda lavra
O mal, de que hoje tantos adoecem:
Falo daquela praga desastrada
Dos enfermos poetas, que não querem
Os remédios tomar para sararem,
Conta-me em que exercícios vás gastando
O tempo que lá tens; se ao som do rio
Compões os brandos versos, com que arrancas
Do cume das montanhas levantadas
Os arreigados cedros para ouvir-te.
Eu, amigo, depois que te deixei,
Triste vejo nascer e pôr-se o Sol;
Os mais dos dias passo em minha casa,
Sentado num banquinho, e recostado
Numa despida banca; poucos livros,
Algum papel, com penas e tinteiro,
É quanto só me adorna o estreito quarto,
Alguns amigos tenho, mas distantes;
Nem cavalos, nem seges à boleia
Tenho para tão longe ir visitá-los:
Temo de sair fora . . . Ah! não te engano,
Temo sair fora: desta banda
Me empurra o aguadeiro, e de estoutra
Me atropela a saloia, c'o seu macho;
Um vem à rede solta no rabão,
Outro corre no coche à desfilada;
Para esta parte fujo, eis que de cima
Sobre mim vem a suja caldeirada;
Os confusos, os vagos pregoeiros
Os ouvidos me atroam com sus gritos:
Um "Quem as flores merca?", outro, os polvilhos.
então eu cá comigo vou dizendo:
"De que servem polvilhos a um poeta,
Se a um filho de Apolo o verde louro
É o melhor adorno, é todo fruto?"
Desta sorte não posso, caro amigo,
Novidades contar-te cá da corte.
Pois que contarei? Eu sei sómente
Que entram naus pela barra, e saem naus
Com velas inchadas; sei que corre
Para o cérulo mar o louro Tejo;
De Lisboa e das cortes estrangeiras
Não saberei dizer-te coisa alguma,
Que o tempo todo gasto em ler Virgílio
No meu pobre, mas certo domícilo.
*
PEDRO ANTÓNIO CORREIA GARÇÃO
"Epístolas"(fragmento)
*
III
Amor, nos olhos da formosa Clara,
Armado não de setas, de ternura,
Cruéis vinganças, implacável jura,
Guerra fatal aos corações declara.
-
Dos brandos tiros que dali dispara
Ninguém pode, ninguém fugir procura,
que do mesmo poder da formusura
nem um peito de bronze se depara.
-
Seus lindos olhos, com desdem movidos,
ficam desejos mil, rendem mil peitos,
Lançam por terra corações feridos.
-
Se esquivos causam tão cruéis efeitos,
Inda causam mais ânsias, mais gemidos,
quando se deixam ver a amor sujeitos.
*
PEDRO ANTÓNIO JOAQUIM CORREIA GARÇÃO
"Soneto"
*
(Mais Poemas . . . "NEGRAS CAPAS . . .POETAS DE
COIMBRA", pág. 195)

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