quarta-feira, 29 de julho de 2009

038 - " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "

MANUEL DA VEIGA TAGARRA


Nasceu no século XVI, possívelmente em Évora, Portugal.
Origem Italiana, de uma das mais antigas e nobres famílias.
Doutourou-se em Direito e Cânones, na Universidade
de Évora, cónego Augustianiano, ou de São João
Evangelista. . .






*

CANTOePALAVRAS
Laura de Anfriso, 1628
"Meu Jardim" Fotos LuisD.
*
Sereno e claro Rio
que ides acrescentado
Com as lágrimas em fio,
Que em vingança de amor choro e derramo
Em quanto a surda morte busco e chamo.
-
Assi nunca vos faltem
Rosas, e flores belas,
Que vossa praia esmaltem:
Assi as Ninfas teçam em vós grinaldas
De finos diamantes e esmeraldas:
-
Assi as açucenas
E os roxos cravos ornem
Vossas veigas amenas;
E em vós faça Pomona seu tesouro
Brotando em vossa margem pomos de ouro:
-
Assi o Sol ardente
Não seque com seus raios
Vossa branda corrente:
Assi do tempo não sintais rigores:
Que as mágoas me escutais de minhas dores:
-
Levai ao Oceano
Estas lágrimas tristes,
Testemunhas do engano,
Que o lisongeiro amor me andou fazendo,
De cujas falsas glórias me arrependo.
-
Levai em vossas águas
Pera eterna mem. . .
Escritas minhas mágoas;
Que é meu penoso mal de tanta dura,
Que inda na água conserva a escritura.
-
Levai, levai escritos
Os gemidos sem conto,
Os prantos infinitos,
Os suspiros imortais de cento em cento,
Emblemas funerais de meu tormento.
*
MANUEL DA VEIGA TAGARRO
Outra Ode (ode VIII do livro V)
Laura de Anfriso
"Jardim Botânico de São Paulo, Brasil" Foto LuisD.

039 - " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "


DIOGO BERNARDES
" Poeta do Lima " (pseudonimo)
Nasceu em 1530, Ponte da Barca, Província do Minho, Portugal.
Irmão de Frei Agostinho da Cruz. Se envolveu com política,
e guerra no Reinado de S. Sebastião e depois de Felipe II,
na batalha de Alcácer-Quibir, África foi apresionado pelos mouros.
Existe, um Teatro muito famoso em Portugal, em sua homenagem,
"Teatro Diogo Bernardes" em Ponte de Lima, Província do Minho,
construído em 1893, e inaugurado em 1896, se realiza o
"Festival de Opera e Música Clássica de Ponte de Lima"
Internet site www.cm-pontedelima.pt/
Faleceu em 1605, Ponte da Barca, Minho, Portugal.
*
CANTOePALAVRAS
Várias Rimas ao Bom Jesus, 1594; Lima, 1596;
Rimas Várias-Flores do Lima, 1596 . . .
*
I
Brandas águas do Tejo, que passando
Por estes verdes campos que regais,
Plantas, ervas, e flores, e animais,
Pastores, Ninfas ides alegrando;
-
Não sei, ah doces águas, não sei quando
Vos tornarei a ver; que mágoas tais
Vendo, como vos deixo, me causais,
Que já vou de tornar desconfiando.
-
Ordenou o meu fado, desejoso
De converter meus gostos em pezares,
Partindo que me vai custando tanto:
-
Saudoso de vós, dele queixoso
Encherei de suspiros outros ares,
Turvarei outras águas com meu pranto.
*
DIOGO BERNARDES
" Soneto "
*
II
Alcido, toma esta rosa
que por minha mão colhi;
Antes eu tomara a ti,
Sílvia, muito mais fermosa
*
DIOGO BERNARDES
" Cantigas VII "
*
III
Escapei de cem mil mouros,
e nesta, terra somata
H~ua só moura me mata.
*
DIOGO BERNARDES
" Vilancete "
*
IV
Poem-me onde queima o Sol toda a verdura,
ou onde seu ardor a neve esfria:
Poem-me onde pello meio o carro guia,
ou onde cobre, ou mostra a luz mais pura;
-
Poem-me em baixa, ou propera venrura,
No sereno da lua, em longo, ou breve dia,
em sazão inda verde, ou já madura.
-
Em valle, em monte, em agoa, em fogo, em ar,
nas estrellas me poem, ou no profundo,
sprito livre, ou inda à carne atado,
-
Com nome escuro, ou claro em todo o mudo,
serei qual fui, não deixarei d'amar
a quem amei até gora desamado.
*
DIOGO BERNARDES
" Soneto XXIV "
Rimas Várias Flores de Lima
(Mais Poemas . . . " Donde
Borbota, minha Saudade",193).
*
V
Horas breves de meu contentamento,
nunca me pareceu, quando vos tinha,
que vos visse tornadas tão asinha
em tão compridos dias de tormento.
-
aquelas torres, que fundei ao vento,
o vento, as levou, já que as sustinha,
do mal, que me ficou, a culpa é minha,
que sobre coisas vãs fiz fundamento.
-
Amor com rosto ledo, e vista branca
promete quando dele se deseja,
tudo possível faz, tudo segura:
-
mas dês que dentro n'alma reina, e manda,
como na minha fez, quer que se veja
quão fugitivo é, quão pouco dura.
*
DIOGO BERNARDES
"Horas Breves de meu Comportamento"

segunda-feira, 27 de julho de 2009

040 - Miguel Torga " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "


MIGUEL TORGA
Adolfo Correia da Rocha
Nasceu a 12 de agosto de 1907, signo de leão, Vila Real de
São Martinho de Anta, Província de Trás-os-Montes, Portugal.
Poeta, Morou no Brasil, ainda jovem, voltou para Portugal,
Doutorou-se na Faculdade de Medicina da Universidade de
Coimbra, 1933. Esteve preso, por divergências políticas e alguns
de seus livros censurados, proibidos de serem editados!!!!!????
Homenagens: Biblioteca Municipal "Miguel Torga", 2003, Miranda
do Corvo, Portugal.
Faleceu em 17 de Janeiro de 1995, Coimbra, Portugal.
*
*
CANTOePALAVRAS
Ansiedade, 1907; Rampa, 1930; Tributo, 1931;
O Outro Livro de Job, 1936; Bichos (conto), 1940;
Contos da Montanha (conto), 1941; Mar (teatro), 1941;
Terra Firme (teatro), 1941; Lamentação, 1943; Liberdade, 1944;
Novos Contos da Montanha (conto), 1944;
Vindima (romance), 1945;
Sinfonia(teatro), 1947; O Paraíso (teatro), 1949;
Cântico do Homem, 1950; Pedras Lavradas (conto), 1951;
Odes, 1956;
Orfeu Rebelde, 1958; Orfeu Rebelde, 1958;
Câmara Ardente,1962;
Poemas Ibéricos, 1965; Fogo Preso, 1976 . . .
*
I
Somos nós
As humanas cigarras!
Nós,
Desde o tempo de Esopo conhecidos . . .
Nós,
Preguiçosos insectos perseguidos.
-
Somos nós os ridículos comparsas
Da fábula burguesa da formiga.
Nós, a tribo faminta de ciganos
Que se abriga
Ao luar.
Nós, que nunca passamos,
A passar!
-
Somos nós, e só nós podemos ter
Asas sonoras.
Asas que em certas horas
Palpitam.
Asas que morrem, mas que ressuscitam
Da sepultura!
E que da planura
Da seara
Erguem a um campo de maior altura
A mão que só altura semeara.
-
Por isso a vós, Poetas, eu levanto
A taça fraternal deste meu canto,
E bebo em vossa honra o doce vinho
Da amizade e da paz!
Vinho que não é meu,
Mas sim do mosto que a beleza traz!
-
E vos digo e conjuro que canteis!
Que sejais menestréis
duma gesta de amor universal!
Duma epopeia que não tenha reis,
Mas homens de tamanho natural!
-
Homens de toda a terra sem fronteiras!
De todos os feitos e maneiras,
Da cor que o Sol lhes deu à flor da pele!
Crias de Adão e Eva verdadeiras!
Homens da torre de Babel!
-
Homens do dia-a-dia
Que levantem paredes de ilusão!
Homens de pés no chão,
Que se calcem de sonho e de poesia
Pela graça infantil da vossa mão!
*
MIGUEL TORGA
" Aos Poetas "
Odes
*
II
Melodia, melodia . . .
Como é simples e tu vens!
Como nasces da harmonia
Das formas que nunca tens!
-
Como vive e eternidade
Na fugidia presença
Da tua realidade
Irreal logo à nascença!
-
Não se vê quem te levanta
Nem quem tece o teu destino;
Mas alguém te desencanta,
Te revela e te faz hino
Do nosso amor, melodia!
-
Vai cantando!
Vai passando e vai durando,
Asa branca deste dia!
*
MIGUEL TORGA
" À Música "
Odes
*
III
Foi então que vim de longe,
duns vagos mundos,
e disse:
"Devotados Apóstolos, eu sei
que conheceis algumas teorias;
ora eu sou assim e etc.,
ensinai-me! . . .
-
Todos calados, ouvimos
as vontades interiores
de todos,
que lutavam
para encontrar a Verdade,
porque eu naquela fome desgraçada
pedia Pão Verdadeiro . . .
-
e calados
estivemos
um século inteiro" . . .
*
MIGUEL TORGA
" Cântico "
O Outro Livro de Job
*
IV
Eis o rosto de Apolo iluminado!
Eis o mundo coberto de alegria!
Quando sorri um deus, fica doirado
O céu que a sua raiva enegrecia.
-
Eis a luz da verdade
Aberta sobre a noite da mentira!
Eis a harmonia que nenhuma lira
Reproduz!
Ressuscitada e alada, a criação
Deixa morta no chão
À sombra secular da sua cruz.
-
Transparente e feliz, tudo parece
Representar num palco de magia;
Mas corre-se a cortina à fantasia,
E a estranha maravilha permanece!
-
Nada tem a espessura, que mostrava
À cegueira de cada hesitação.
Nada tem um taipal de solidão.
A rodear-lhe os passos.
Gestos, hostis na escuridão,
São abraços!
-
Verdes, amadurecem
Os corações;
Velhas, rejuvenescem
Às ilusões;
E na mesma fogueira onde se aquecem,
Comungam sentimentos e paixões.
-
Em festas de resgate e de calor
À vida reconquista o seu reinado.
E é o amor
E o pecado
Num paraíso agora consentido;
Já que o gostoso pomo nos foi dado,
Poderá finalmente ser comido!
-
O carnaval do mundo terminou!
E o que agora deseja o Arlequim
É despir no jardim
A cobardia que o mascarou.
-
Sol do corpo e de alma,
Claridade da pele e dos sentidos!
Sol da perfeita calma,
Nua sob a vergonha dos vestidos!
*
MIGUEL TORGA
" Ao Sol "
Odes
*
V
Encontraram-no caído
ao fundo daquela rua;
chamaram-no pelo nome, e era eu!
- O Poeta andava à lua
e adormeceu . . .
-
Foi o que disse e jurou
pela sua salvação
a Perdida
que viu tudo pela janela . . .
E o guarda soube por Ela,
pelo pranto que chorava,
quem era na minha vida
o Guarda que me guardava. . .
-
- Andar à lua é proibido . . .
Mas Ela pagou a lei
por um beijo que lhe dei
antes ou depois de ter caído,
nem eu sei . . .
*
MIGUEL TORGA
" Noite "
O Outro Livro de Job
*
VI
Além,
mais adiante ainda,
fora do vosso alcance,
mora aquele do meu romance
que não finda . . .
-
Ali,
onde ninguém o sabe,
e vive, para que a Vida
não acabe . . .
-
Deserto
onde não há solidão . . .
(Cada miragem é uma veia
que recolhe a alma cheia
do que lhe dão . . .)
-
Sofre,
mas a sua dor não é
como a dor de quem não ama
ou como a pior de quem chama
sem Fé . . .
-
Chora,
mas o seu pranto não é sal desfeito . . .
As lágrimas desumanos são
feitas de humano perdão
e respeito . . .
-
Homem,
foi na Terra que nasceu . . .
Mas libertou-se da terra
como um Guerreiro da guerra
em que morreu . . .
-
Profeta,
olha de longe as horas do futuro . . .
E as suas visões são belas,
e o seu amor é por elas,
e é puro . . .
-
Outro,
nem eu sei conhecer
nessa grandeza de Santo
onde mora o meu encanto
de viver . . .
*
MIGUEL TORGA
" Canção duma outra Vida "
O Outro Livro de Job
*
VII
Não posso render, haja o que houver.
Salvar a vida pouco me adianta.
O pendão que levanta
A minha decidida teimosia,
-
Transcende a noite e o dia
De uma breve e terrena duração.
Luto por todos e também por mim,
Mas assim:
Desprendido da própria perdição.
-
É o espirito da terra que eu defendo,
Numa cega constância
De namorado:
Esta causa perdida em cada instância,
E sempre a transitar de tempo e de julgado.
*
MIGUEL TORGA
"Mensagem"
Penas do Purgatório
*
VIII
O que um verso demora!
A esta mesma hora,
Quantos poetas, como eu, à espera!...
Passou o inverno, veio a primavera,
Deitou-se a noite, ergueu-se a madrugada,
E a voz
De todos nós
Cativa na garganta estrangulada!
-
Nenhum sinal no céu de próximo milagre;
Os adivinhos mal nos adivinham;
E os restantes humanos,
Há infinitos anos
Que apenas tecem
A tela da rotina,
Como o instinto os ensina.
-
E resta-nos a força
Que empurra os cegos contra a claridade.
Ter confiança é deslaçar metade
Do nó do tempo que o destino aperta.
Suprema descoberta
Doutros que no passado desesperaram,
E foram premiados, e cantaram.
-
Mas pesa como um luto
Este silêncio hostil
E fere como raiva dum cilício
A certeza da morte
Colado ao corpo.
que desgraça
Desconhecida,
Se a nudez ultrapassa
A nossa vida!
*
MIGUEL TORGA
"Miserere Nobis"
Orfeu Rebelde
*
IX
Vou de comboio...
Vou
Mecanizado e duro como sou
Neste dia;
- E mesmo assim tu vens, tu me visitas!
Tu ranges nestes ferros e palpitas
Dentro de mim, Poesia!
-
Vão homens a meu lado distraídos
Da sua condição de almas penadas;
Vão outros à janela, diluídos
Nas paisagens passadas...
E porque hei-de ter eu nos meus sentidos
As tuas formas brancas e aladas?
-
Os campos, imprecisos, nos meus olhos,
Vão de braços abertos às montanhas;
O mar protesta contra não sei o quê;
E eu movido por ti, por tuas manhas,
A sonhar um painel que se não vê!
-
Porque me tocas? Porque me destinas
Este cilício vivo de cantar?
Porque hei-de eu padecer e ter matinas
Sem sequer acordar?
-
Porque há-de a tua voz chamar a estrela
Onde descansa e dorme a minha lira?
Que razão te dei eu
Para que a um gesto teu
A harmonia me fira?
-
Poeta sou e a ti me escravizei,
Incapaz de fugir ao meu destino.
Mas, se todo me dei,
Porque não há-de haver na tua lei
O lugar do menino
que a fazer versos e a crescer fiquei?
-
Tanto me apetecia agora ser
Alguém que não cantasse nem sentisse!
Alguém que visse padecer,
E não visse...
-
alguém que fosse pelo dia fora
Neutro como um rapaz
Que come e bebe a cada hora
Sem saber o que faz...
-
Alguém que não tivesse sentimentos,
Pressentimentos,
E coisas de escrever e de exprimir...
alguém que se deitasse
No banco mais comprido que vagasse,
E pudesse dormir...
-
Mas eu sei que não posso.
Sei que sou todo vosso,
Ritmos, imagens, emoções!
Sei que serve quem ama,
E que eu jurei amor à minha dama,
À mágica senhora das paixões.
-
Musa bela, terrível e sagrada,
Imaculada Deusa do condão:
Aqui vou de longada;
Mas aqui estou, e aqui serás louvada,
Se aqui mesmo me obriga a tua mão!
*
MIGUEL TORGA
"À Poesia"
Odes
*
(Mais Poemas. . . "Negras Capas . . . Poetas de Coimbra", pág.196;
"O CANTO . . . do encanto das . . . PALAVRAS", pág. 189).

041 - " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "


TONY TCHECA
António Soares Lopes
Nasceu a 21 de dezembro de 1951, signo de sagitário,
cidade de Bissau, Guiné-Bissau, África.
Escreve numa mistura de português com crioulo. . .
*
CANTOePALAVRAS
Eco do Prant, 1992; Noites de Insónia na
Terra-Adormecida, 1996; Guiné Sabura que Doi . . .
*
Dóli só
Djena sem ninguém
do romance inocente
a tragédia bacilenta.
-
Papá homem grande
Se meteu
Uma vaca
Um saco de farinha
Um tambor de cana
Umas folhas de tabaco.
-
A permuta
A prometida
-
Três
Dias
Depois
Da Lua.
-
com fome de amor
Boca acre não come
Com sede de ternura
Garganta seca rejeita água
As lágrimas engrossam
E rolam
No rosto macilento.
-
Djena dezassete chuvas
Djena uma vida por viver
Djena a prometida
Djena mulher de hoje
Tem fome
não come
Tem sede
não bebe.
-
Corpo de mulher
Inerte como o silêncio
firme como a recusa
repousa intacta
num sono inviolável.
*
TONY TCHECA
" A Prometida "

sábado, 25 de julho de 2009

042 - Hilda Hilst " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "

HILDA HILST
Hilda de Almeida Prado Hilst
Nasceu a 21 de abril de 1930, signo de touro,
Jaú, Estado de São Paulo, Brasil.
Se formou em Direito na Universidade de
São Paulo (U.S.P)., Brasil
Homenagens: Premio "Pen", Clube de S. Paulo, 1962;
Premio Anchieta, 1977; Associação Paulista de Críticos
de Arte, 1977; Premio "Jabuti", 1984 e 1993;
Premio "Cassiano Ricardo", 1985; Premio "Moinho Santista"
2002 . . .
Seu corpo, faleceu em 04 de fevereiro de 2004, Campinas, Brasil.
*
CANTOePALAVRAS
Presságio, 1950; Balada Alzira, 1951; Balada do
Festival, 1955; Roteiro do Silêncio, 1959;
Trovas de muito amor para um amado senhor, 1959;
Ode Fragmentária, 1961; Sete Cantos do Poeta para o Anjo, 1962;
Exercícios para uma ideia, 1967;
Da Morte/Odes Mínimas, 1980;
Júbilo, Memória, Noviciado da Paixão, 1974;
Amavisse, 1989; Alcoólicas, 1990;
Cantares do sem Nome e de Partidas, 1995
A Possessa (teatro), 1967; O visitante (teatro), 1968; O Verdugo (teatro), 1969;
Fluxofloema (Ficção), 1970; Qadós (ficção), 1973; Ficções (ficção), 1977...
"Bromélia",
Meu Jardim.
Foto LuisD.
*
I


E crivada de Hera?
Mas só pensada.
Em Matemática pura.
*
HILDA HILST
"À tua frente, em Vaidade"
*
II
E se eu ficasse eterna?
Demostrável
Axioma de pedra.
*
HILDA HILST
" Poeta Inventa. Viagem Retorno e sofre de Saudade "
*
IIIdetalhe do quadro "Saudade", 1899,
 pintor Almeida Junior, Brasil.

Ah, se eu soubesse quem sou.
Se outro fosse o meu rosto.
Se minha vida-magia
fosse a vida que seria
Vida melhor noutro rosto.
-
Ah, como eu queria cantar
De novo, como se nunca tivesse
De parar. Como se o sopro
Só soubesse de si mesmo
Através da tua boca.
-
Como se a vida só entendesse
O viver
Morando no teu corpo, e a morte
Só em mim se fizesse morrer.
*
HILDA HILST
" V "
Júbilo, Memória, Noviciado da Paixão
*
"Orquidea" Foto LuisD.
IV
Por que me fiz poeta?
Porque tu, morte, minha irmã,
No instante, no centro
De tudo o que vejo.
-
No mais que perfeito
No veio, no gozo
Colada entre eu e o outro.
No fosso
No nó de im íntimo laço
No hausto
No fogo, na minha hora fria.
-
Me fiz poeta
Porque à minha volta
Na humana idéia de um deus que não conheço,
A ti, morte, minha irmã
Te vejo.
*
HILDA HILST
" XXXII "
Júbilo , Memória, Noviciado da Paixão
*
V
Tenho pedido a Deus, e à Lua, ontem
Hoje, a cada noite, PERPETUIDADE
Desde o instante em que me soube tua.
E que o luar e o divino perdoassem
O meu rosto anterior, rosto-menino
Travestido de aroma, despudor contente
De sua brevidade em tudo, nos afetos
No fingido amor
Porque fui tudo isso, bruxa, duende
Desengano e desgosto quase sempre.
-
Mais nada pedi a Deus. Mas pedi mais
À Lua que tu sofresses tanto quanto eu.
*
HILDA HILST
" IV "
Júbilo, Memória, Noviciado da Paixão
*
VI
É meu este poema ou é de outra?
Sou eu esta mulher que anda comigo
E renova a minha fala e ao meu ouvido
Se não fala de amor, logo cala?
-
sou eu que a mim mesma me persigo
Ou é a mulher e a rosa que escondidas
(Para que seja eterno o meu castigo)
Lançam vozes na noite tão ouvidas?
-
Não sei. De quase tudo não sei nada.
O anjo que impulsiona o meu poema
Não sabe da minha vida descuidada.
-
A mulher não sou eu. E perturbada
A rosa em seu destino, eu a persigo
Em direção aos reinos que inventei.
*
HILDA HILST
" . . . . . . . . ."
Roteiro do Silêncio
"Natureza" Foto LuisD.

VII
Levarás contigo
Meus olhos tão velhos?
Ah, deixa-os comigo
De que te servirão?
-
Levarás contigo
Minha boca e ouvidos?
Ah, deixa-os comigo
Degustei, ouvi
Tudo o que conheces
Coisas tão antigas.
-
Levarás contigo
Meu exato nariz?
Ah, deixa-o comigo
Aspirou, torceu-se
Insignificante , mas meu.
-
E minha voz e cantiga?
Meu verso, meu dom
De poesia, sortilégio, vida?
-
Ah, leva-os contigo
Por mim.
*
HILDA HILST
"XI"
Da Morte: Odes Mínimas

*
VIII
Teu nome é Nada.
Um sonhar o Universo
No pensamento do homem;
Diante do eterno, nada.
-
Morte, teu nome.
Um quase chegar perto
Um pouco mais (me dizem)
E terias o Todo no teu gesto.
Um pouco mais, tu O terias visto.
-
Teu nome é Nada.
Haste, pata. Sem ponta, sem ronda.
Um pensar duas palavras diante da Graça:
Terias tido.
*
HILDA HILST
"XX"
Da Morte: Odes Mínimas
*
IX
Sorrio quando penso
Em que lugar da sala
Guardarás o meu verso.
distanciado
Dos teus livros políticos?
Na primeira gaveta
Mais próxima à janela?
Tu sorris quando lês
Ou te cansas de ver
Tamanha perdição
Amorável centelha
No meu rosto maduro?
E te pareço bela
Ou apenas te pareço
Mais poeta talvez
E menos séria?
O que pensa o homem
Do poeta? Que não há verdade
Na minha embriaguez
E que me preferes
Amiga mais pacífica
E menos aventura?
-
Que é de todo impossível
Guardar na tua sala
Vestígio passional
Da minha linguagem?
eu te pareço louca?
Eu te pareço pura?
Eu te pareço moça?
-
Ou é mesmo verdade
Que nunca me soubeste?
*
HILDA HILST
"VII"
Júbilo Memória Noviciado da Paixão
*
X
Se permitires
Traço nesta lousa
O que em mim se faz
E não repousa:
Uma ideia de Deus.
-
Clara como Coisa
Se sobrepondo
A tudo que não ouso.
-
Clara como Coisa
Sob um feixe de luz
Num lúcido anteparo.
-
Se permitires ouso
Comparar o que penso
A Ouro e Aro
Na superfície clara
De um solitário.
-
E te parece pouco
Tanta exatidão
Em quem não ousa?
-
E o mais fundo de mim
Me diz apenas: Canta
Porque à tua volta
É noite, O Ser descansa
Ousa.
*
HILDA HILST
"Exercício n°.1"
Exercícios para uma ideia
*
XI
Se quiserem saber se pedi muito
Ou se nada pedi, nesta minha vida,
Saiba , senhor, que sempre me perdi
Na criança que fui, tão confundida.
À noite ouvia vozes e regressos.
A noite me falava sempre sempre
Do possível de fábulas. De fadas.
O mundo na varanda. Céu aberto.
Castanheiras douradas. Meu espanto
diante das muitas falas, das risadas.
Eu era uma criança delirante
Nem soube defender-me das palavras.
Nem soube dizer das aflições, da mágoa
De não saber dizer coisas amantes.
O que vivia em mim, sempre calava.
-
E não sou mais que a infância. Nem pretendo
Ser outra, comedida. Ah, se soubésseis!
Ter escolhido um mundo, este em que vivo,
Ter rituais e gestos e lembranças
Viver secretamente. Em sigilo 
Permanecer aquela, esquiva e dócil.
E escutar (apesar) entre as paredes
Um ruido inquietante de sorrisos
Uma boca de plumas, murmurante.
-
Nem sempre há de falar-vos um poeta.
E ainda que minha voz não seja ouvida
Um dentre vós, resguardará (por certo)
A criança que foi. Tão confundida.

HILDA HILST
"Testamento Lírico"
Ode Fragmentária