sábado, 25 de julho de 2009

043 - " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "


JOÃO DE DEUS
João de Deus Nogueira Ramos
Nasceu a 08 de março de 1830, signo de peixes,
em S. Bartolomeu de Messines, Província de Algarve, Portugal.
Estudou na Universidade de Coimbra Direito, 1849 a 1859, viveu
toda a boémia das ruas estreitas da cidade, viajou muito, escreveu
para vários jornais, se envolveu com política, mas na realidade
foi um grande poeta . . .
*
CANTOePALAVRAS
Pomba; Flores do Campo, 1868; Folhas Soltas, 1875;
Prosas, 1898 . . .
*
I
A vida é o dia de hoje,
A vida é ai que mal soa,
A vida é sombra que foge,
A vida é nuvem que voa;
-
A vida é sonho tão leve
Que se desfaz como a neve
E como o fumo se esvai:
A vida dura um momento,
Mais leve que o pensamento,
A vida leva-a o vento,
A vida é folha que cai!
-
A vida é flor na corrente,
A vida é sopro suave,
A vida é estrela cadente,
Voa mais leve que ave:
Nuvem que o vento nos ares,
Onda que o vento nos mares,
Uma após outra lançou,
A vida - pena caída
Da asa de ave ferida -
De vale em vale impelida
A vida o vento a levou!
*
JOÃO DE DEUS
" A Vida " (trecho)
Campo de Flores
*
II
Uivara de amor a fera bruta
Que pela grenha te sentisse a mão;
E eu não sou fera, pomba! espera, escuta;
Eu tenho coração!
-
Não é mais preto o ébano, que as tranças
Que adornam o teu colo sedutor!
Ai não me fujas, pomba! que me cansas!
Não fujas, meu amor!
-
A mim nasceu-me o Sol, rompeu-me o dia
Da noite escura de olhos tais, mulher!
Não me apagues a luz que me alumina,
Senão quando eu morrer!
-
Eu não te peço a ti que as mãos de neve,
Os dedos afusados dessas mãos,
Me toquem estas minhas nem de leve . . .
Seriam rogos vãos!
-
Não te peço que os lábios nacarados
Me deixem esses dentes alvejar,
Trocando, num sorriso, os meus cuidados
Em êxtase sem par!
-
Mas uivando de amor a bruta fera
Que pela grenha te sentisse a mão . . .
Eu não sou fera, pomba! escuta, espera!
Eu tenho coração!
*
JOÃO DE DEUS
" Espera "
Campo de Flores
*
III
Não sou eu tão tola,
Que caia em casar;
Mulher não é rola.
Que tenha um só par: Eu tenho um moreno,
Tenho um de outra cor,
Tenho um mais pequeno,
Tenho outro maior.
-
Que mal faz um beijo,
Se apenas o dou,
Desfaz-se-me o pejo,
E o gosto ficou? Um deles por graça
Deu-me um, e depois,
gostei da chalaça,
Paguei-lhe com dois.
-
Abraços, abraços
Que mal nos farão?
Se Deus me deu braços,
Foi essa a razão: Um dia que o alto
Me vinha abraçar,
fiquei-lhe de um salto
Suspensa no ar.
-
Vivendo e gozando,
Que a morte é fatal,
E a rosa em murchando
Não vale em real: Eu sou muito amada,
E há muito que sei
Que Deus não fez nada
Sem ser para quê.
-
Amores, amores,
Deixá-los dizer,
Se Deus me deu flores,
Foi para as colher: Eu tenho um moreno,
Tenho um de outra cor,
Tenho um mais pequeno,
Tenho outro maior
*
JOÃO DE DEUS
"Amores, Amores"
*
IV
vi o teu rosto lindo,
Esse rosto sem par;
Contemplei-o de longe mudo e quedo
como quem volta do áspero degredo
E vê ao ar subindo
O fumo do seu lar!
-
Vi esse olhar tocante,
De um fluido sem igual,
Suave como lampada sagrada,
Benvindo como a luz da madrugada,
Que rompe ao navegante
Depois do temporal!
-
Vi esse corpo de neve,
Que parece que vai
Levado como o Sol ou como a lua
Sem encontrar beleza igual à sua;
Majestoso e suave,
Que surpreende e atrai!
-
Atrai e não me atrevo
A contemplá-lo bem;
Porque espalha o teu rosto uma luz santa,
Uma luz que me prende e que me encanta
Naquele santo enlevo
De um filho em sua mãe!
-
Tremo, apenas pressinto
A tua aparição;
E se me aproximasse mais, bastava
Pôr os olhos nos teus, ajoelhava!
Não é amor, que eu sinto,
É adoração!
-
que asas previdentes
Do anjo tutelar
Te abriguem sempre à sombra pura!
A mim basta-me só esta ventura,
De ver que me consentes
Olhar de longe...olhar!
*
JOÃO DE DEUS
"Adoração"
*
V
Na marcha da vida
Que vai a voar
Por essa descida
Caminho do mar.
-
Caminho da morte
Que me há de arrancar
O grito mais forte
Que eu posso exalar;
-
O aí da partida
Da pátria, do lar,
Dos meus e da vida,
Da terra e do ar;
-
Já perto da onda
Que me há de tragar,
Embora se esconda
No fundo do mar.
-
De noite e de dia
Me alveja no ar
O fumo que eu via
Subir do meu lar!
-
Que sonhos doirados
Me estão a lembrar!
Mas tempos passados
Não podem voltar!
-
Carreira da vida,
Que vás a voar
Por esta descida
Vai mais devagar,
-
Que eu vou deste mundo,
Talvez, descansar,
E nunca do fundo
Dos mares voltar!...
*
JOÃO DE DEUS
"Tristezas"
*
( Mais Poemas . . . " . . . Donde Borbota, minha Saudade, pág. 194 . . " )
PEDRO HOMEM DE MELLO
Pedro da Cunha Pimentel Homem de Mello
Nasceu em 1904, na cidade do Porto, Portugal.
Doutorou-se em Direito na Universidade de Lisboa.
Poeta extremamente regionalista e folclorista . . .
*
CANTOePALAVRAS
Caravela ao Mar, 1934; Segredo, 1939; Pecado, 1942;
Principe Perfeito, 1944; Bodas Vermelhas, 1947;
Misere, 1948; Adeus, 1951; Os Amigos Infelizes, 1952;
O Rapaz da Camisola Verde, 1954; Grande, Grande Era
a Cidade, 1955; Há uma Rosa na Manhã Agreste, 1964;
Povo que Lavas no Rio, 1969; Fandangueiro, 1971;
Cartas de Inglaterra, 1973; Ecce Homo, 1974; Pedro, 1975 . . .
*
Naquele branco navio
Que ao longe parece fumo,
Que as ondas do mar salgado
Parecem deixar sem rumo,
Sou eu quem vai embarcado.
Província! Minha província
Como agora me lembrais!
Cheiro da terra molhada
Resina dos pinheirais!
Província! Minha Província!
Arga! Bonança! Peneda!
Formariz e Portuzelo!
Abelheira e Pomarchão!
Ai Ponte de Mantelais!
Aldeia de Verdoejo!
Ai S. Miguel de Frontoura!
Friestas! Paçô! Venade!
Vilar de Moiros! Carreço!
Santa Cristina de Alfife!
E lá no fundo Cabanas . . .
rio Minho! Rio Coura!
Rio de Ponte do Lima!
Rio de Ponte da Barca!
(O mar começa Em Vi-Ana . . .)
Ai! a Torre de Quintela
Mai-la da Glória! Bretiandos!
Ai Paço do Cardido!
Nossa Senhora de Aurora!
Alminhas de Além da Ponte!
Ai Cruzeiro da Matança!
Ai! as árvores da Gelfa!
Bruxarias e ladrões . . .
Certa mão branca nos muros . . .
Vozes na casa deserta . . .
Ai! o vento! A noite! o medo!
E a madrugada? E os poentes?
E as rusgas? E as romarias?
Mocidade! Mocidade!
Capelinha de S. Bento!
Carreirinhos ao luar . . .
( Por quantos deles não vão
Os homens à perdição
Que logo à morte vai dar?)
Ai! leiras de milho alto!
Videiras! Ai videirinhas!
Canções na pisa do vinho!
Toadilhas de aboiar!
Esfolhadas! Esfolhadas!
Ai! Bailaricos na praia
Pelas cortas do argaço!
Tiranas! Viras e gotas!
Verde Gaio! Verde Gaio!
Minha vila bréjeira!
Minha harmônica tombada!
Como agora me lembrais!
E aquele pinheiro manso
Ao dar a volta da estrada?
E aqueles beijos contados
Nos dedos daquela mão?
E as ondas do mar baloiçam
Já não sei que embarcação . . .
E aquele branco navio
Que ao longe parece fumo,
Que as ondas do mar salgado
Parecem deixar sem rumo,
(Aquele branco navio!)
É vida humana. Pecado
Maior do que o mar salgado.
Que o mar, sem ele é vazio!
*
PEDRO HOMEM DE MELLO
"Degredo"
Pecado

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