quarta-feira, 24 de junho de 2009

075 - Cecília Meireles " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "

CECÍLIA MEIRELES
Nasceu a 07 de novembro de 1901, signo de escorpião,Rio de Janeiro
(antiga capital do Brasil) bairro de Tijuca, Brasil.
Orfã de pai e mãe, aos oito anos de idade, foi educada
pela avó materna Jacinta Garcia Benevides,nascida na Ilha de S. Miguel, Açores. Cecilia Meireles foi professora e viajou, para México, Uruguai, Argentina, Ìndia, Goa,Açores, Porto Rico, Israel, Portugal e Europa . . .
"Premio de Poesia" da Academia Brasileira de Letras, 1938,Com o livro "Viagem".
Divulgou de um modo geral o folclore brasileiro, nomeada em 1948, como especialista pela "Comissão Nacional de Folclore." Homenagens:
Sócia honorária do "Gabinete Português de Leitura", do Rio de Janeiro e "Instituto Vasco da Gama" Goa.

"Orquidea" Foto LuisD.
Doutora "Honoris Causa" Universidade de Délhi, India, Grau de Oficial Da "Ordem de Mérito", Chile, 1952; Prémio "Machado de Assis", 1938, Academia Brasileira de Letras.
Sala de concertos "Cecília Meireles" Rio de Janeiro. . .
Estilo Modernista
Faleceu a 09 de novembro de 1964.
*
CANTOePALAVRAS
Espectros, 1919; Nunca Mais e Poemas dos Poemas, 1923;
Baladas para El-Rei, 1925;Viagem, 1939;
Notícia da Poesia Brasileira(folheto, na "Biblioteca Geral
da Universidade de Coimbra"), 1935;
Vaga Música, 1942; Mar Absoluto,1945;
A Nau Catarineta(teatro folclórico), 1946;
RetratoNatural,1949; Amor em Leonoreta, 1952;
12 Noturnos da Holanda e O Aeronauta, 1952;
Romanceiro da Inconfidência, 1953; Pequeno Oratório
de Santa Clara, 1955; Pistóia, Cemitério Militar
Brasileiro, 1955; Canções, 1956; Giroflê, Giroflá, 1956;
Romance de Santa Cecília, 1957; A Rosa, 1957;
Obra Poética, 1958; Metal rosicler, 1960;
Poemas Escritos na Índia, 1961; Antologia Poética, 1963;
Solombra, 1963; Ou Isto ou Aquilo, 1964;
Crônica Trovada da Cidade de Sam Sebastian, 1965;
O Menino Atrasado(teatro), 1966;
Escolha o seu Sonho(crônicas), 1970 . . .
*
I
Não sejas o de hoje.
Não suspires por ontens . . .
Não queiras ser o de amanhã.
Faz-te sem limites no tempo.
Vê a tua vida em todas as origens
Em todas as existências.
Em todas as mortes.
E sabe que serás assim sempre.
É a passagem que se continua.
É a tua eternidade . . .
É a eternidade.
És tu.
*
CECÍLIA MEIRELES
"Cânticos"
*
II
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
Sou poeta.
-
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
-
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico ou passo.
-
sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo: - mais nada.
*
CECÍLIA MEIRELES
"Motivo"
Viagem
*
III
Aquilo que ontem cantava
já não canta.
Morreu de uma flor na boca:
não do espinho na garganta.
-
Ele amava a água sem sede,
e, em verdade,
tendo asas, fitava o tempo,
livre de necessidade.
-
Não foi desejo ou imprudência:
não foi nada.
E o dia toca em silencio
a desventura causada.
-
Se acaso isso é desventura:
ir-se a vida
Sobre uma rosa tão bela,
por uma tênua ferida.
*
CECÍLIA MEIRELES
"Pássaro"
Retrato Natural
"Orquidea" Foto LuisD.
*
IV
Bem-Te-Vi que estás cantando
nos ramos da madrugada,
por muito que tenhas visto,
juro que não viste nada.
-
Não viste as ondas que vinham
tão desmanchadas na areia,
quase vida, quase morta,
quase corpo de sereia . . .
-
E as nuvens que vão andando
com marcha e atitude de homem,
com a mesma atitude e marcha
tanto chegam como somem.
-
Não viste as letras, que apostam
formar idéias com o vento . . .
e as mãos da noite quebrando
os talos do pensamento.
-
Passarinho tolo, tolo,
de olhinhos arregalados . . .
Bem-Te-Vi, que nunca viste
como os meus olhos fechados . . .
*
CECÍLIA MEIRELES
" Cantiga "
Viagem
*
V
Alto, pálido vidente,
caminhante do vazio,
cujo solo suficiente
é um frágil, aéreo fio!
-
Sem transigência nenhuma,
experimentas teu passo,
com levitações de pluma
e rigores de compasso.
-
No mundo, jogam à sorte,
detrás de formosos muros,
à espera de tua morte
e dos despojos futuros.
-
E tu, cintilante louco,
vais, entre a nuvem e o solo,
só com teu ritmo - tão pouco!
Estrela no alto do pólo.
*
CECÍLIA MEIRELES
"Equilibrista"
Canções
*
VI
De que maneira chegaremos
às brancas portas da Via-Láctea?
-
Será com asas ou com remos?
Será com músculos com que saltas?
-
Leva-me agarrada aos teus ombros
como um cendal para agasalhar-te!
-
Seremos pássaros ou anjos
atravessando a sombra da tarde!
-
Deixaremos a terra juntos
e justapostos como metades,
-
sem o triste pó dos defuntos,
sem qualquer bruma que enlute os ares!
-
Sem nada de humanos assuntos:
muito mais puros, muito mais graves!
*
CECÍLIA MEIRELES
" Trapezista "
Canções
*
VII
Embora chames burguesa,
Ó poeta moderno, à rosa,
não lhe tiras a beleza.
-
A tua sanha imprevista
contra a vítima formosa,
é um mero ponto de vista.
-
Pode a sanha ser moderna.
pode ser louvada, a glosa:
mas sendo a Beleza eterna,
-
que vos julgue o Tempo sábio:
entre os espinhos, a rosa,
entre as palavras, teu lábio.
*
CECÍLIA MEIRELES
"Fragmento de"
Metal Rosicler
*
VIII
De que são feitos os dias?
- De pequenos desejos
vagarosos as saudades,
silenciosas lembranças.
-
Entre mágoas sombrias,
momentâneos lampejos:
vagas felicidades,
inatuais esperanças.
-
De loucuras, de crimes,
de pecados, de glórias,
- do medo que encadeia
todas essas mudanças.
-
dentro deles vivemos,
dentro deles choramos,
em duros desenlaces
e em sinistras alianças . . .
*
CECÍLIA MEIRELES
" De que são feitos os dias?"
Canções
*
IX
Cada palavra uma folha
no lugar certo.
-
Uma flor de vez em quando
no ramo aberto.
-
Um pássaro parecia
pousado e perto.
-
Mas não: que ia e vinha o verso
pelo universo.
*
CECÍLIA MEIRELES
"Fragmento de"
Metal Rosicler
*
X
Por aqui vou sem programa,
sem rumo,
sem nenhum itinerário.
O destino de quem ama
é vário,
como o trajeto do fumo.
-
Minha canção vai comigo.
Vai doce.
Tão sereno é seu compasso
que penso em ti, meu amigo.
- Se fosse,
em vez da canção, teu braço!
-
Ah! mas logo ali adiante
- tão perto! -
acaba-se a terra bela.
Para este pequeno instante,
decerto,
é melhor ir só com ela.
-
(Isto são coisas que digo,
que invento,
para achar a vida boa . . .
A canção que vai comigo
é a forma de esquecimento
do sonho sonhado à toa . . .)
*
CECÍLIA MEIRELES
" Canção do Caminho "
Vaga Música
*
XI
Há um nome que nos estremece,
como quando se corta a flor
e a árvore se torce e padece.
-
Há um nome que alguém pronuncia
sem qualquer alegria ou dor,
e que em nós, é dor e alegria.
-
Um nome que brilha e que passa,
que nos corta em puro esplendor,
que nos deixa em cinza e desgraça.
-
Nele se acaba a nossa vida,
porque é o nome total de amor
em forma obscura e dolorida.
-
há um nome levado no vento.
Palavra. Pequeno rumor
entre a eternidade e o momento.
*
CECÍLIA MEIRELES
"Há um Nome"
Canções
*
XII
Já se ouve cantar o negro.
mas inda vem longe o dia.
Será pela Estrela D'alva,
com seus raios de alegria?
Será por algum diamante
a arder, na aurora tão fria?
-
Já se ouve cantar o negro,
pela agreste imensidão.
seus donos estão dormindo:
quem sabe o que sonharão!
Mas os feitores espiam,
de olhos pregados no chão.
-
Já se ouve cantar o negro.
Que saudade, pela serra!
Os corpos, naquelas águas,
- as almas, por longe terra.
Em cada vida de escravo,
que surda, perdida guerra!
-
Já se ouve cantar o negro.
Por onde se encontrarão
essas estrelas sem jaça
que livram da escravidão,
pedras que, melhor que os homens,
trazem luz no coração?
-
Já se ouve cantar o negro.
Chora neblina, a alvorada.
Pedra miúda não vale:
liberdade é pedra grada . . .
(A terra toda mexida,
a água toda revirada . . .
-
DEUS do céu, como é possível
penar tanto e não ter nada!).
*
CECÍLIA MEIRELES
" Do Negro nas Catas "
Romanceiro da Inconfidência
*
XIII
Vi teus vestidos brilharem
sem qualquer clarão do dia.
Disseram ser luz de flores,
flores de campos extensos,
cujos nomes nem sabiam . . .
-
Vi teu rosto luminoso
inclinar-se em meu silêncio.
Mas disseram ser a lua,
prismas de estrelas, areias,
marinha fosforescência . . .
-
E a tua voz me falava
em grandes raios profusos.
Mas diziam ser o vento,
o outono pelas ramagens,
o idioma cego dos búzios . . .
-
E andei contigo em minha alma
como os reis levam coroas
e as mães carregam seus filhos
e o mar o seu movimento
e a floresta seus aromas.
-
Diziam que era da noite,
da miragem dos desejos
Hei de banhar os meus olhos
nas mil ribeiras da aurora,
para ver se ainda te vejo.
*
CECÍLIA MEIRELES
" Nove "
Doze Noturnos da Holanda

"Orquidea" Foto LuisD.

*
XIV
Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.
-
Minhas mãos ainda estão molhadas 
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre dos meus dedos 
colore as areias desertas.
-
O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...
-
Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.
-
Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.
*
CECÍLIA MEIRELES
"Canção"
Viagem
*
XV
Pequena lagartixa branca,
ó noiva brusca dos ladrilhos!
sobe à minha mesa, descansa,
debruça-te em meus calmos livros.
-
Ouve comigo a voz dos poetas
que agora não dizem mais nada,
- e diziam coisas tão belas! -
ó ídolo de cinza e prata!
-
Ó breve deusa do silêncio
que ma face da noite corres
como a dor pelo pensamento,
- e sozinha miras e foges.
-
Pequena lagartixa - vinda
para quê? - pousa em mim teus olhos.
Quero contemplar tua vida,
a repetição dos teus mortos.
-
Como os poetas que já cantaram,
e que já ninguém mais escuta,
eu sou também a sombra vaga
de alguma interminável música.
-
Pára em meu coração deserto!
Deixa que te ame, ó alheia, ó esquiva...
Sobre a torrente do universo,
nas pontes frágeis da poesia.
*
CECÍLIA MEIRELES
"Comunicação"
Retrato Natural



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