domingo, 15 de fevereiro de 2009

180 - Sá-Miranda " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "

»1283«
SÁ-MIRANDA
Francisco de Sá-Miranda
Nasceu em 28 de Agosto de 1481, Coimbra(Aeminium), Portugal.
Poeta, doutorou-se, na Universidade de Lisboa.
Foi inovador na poesia portuguesa, alguns modos clássicos
como comédia em prosa, terceto, soneto, oitava, elegia, a écloga . .
e muito mais.
Estilo Renascentista
Faleceu em 1558, Quinta da Tapada, Província do Minho, Portugal
*
CANTOePALAVRAS
Baso; Alexo; Os Estrangeiros; Vilhalpandos. . .
I
O Sol é grande; c'a calma as aves,
do tempo em tal sazão, que soe ser fria.
Esta água que cai d'alto, acordar-m'-ia
Do sono não, mas de cuidado graves.
.
Ó cousas, todas vãs, todas mudaves!
qual é tal coração qu'em vos confia?
Passam os tempos, vai dia tráz dia.
Incertos muito mais que o vento as naves.
.
Eu vira já aqui sombra, vira flores
Vi tantas águas,
vi tanta verdura.
as aves todas cantavam d'amores
.
Tudo é seco e mudo; e, de mistura,
também mudando-m'eu fiz doutra cores
E tudo o mais renova, isto é sem cura!
.*.
SÁ MIRANDA
"O Sol é grande"
Soneto 22
*
II
Deixai-me as minhas tristezas,
que já agora outra alegria
maior perigo seria.
-
Aos males acostumados
o mesmo costume é cura.
Bens tão vãmente  esperados,
quem os sofre? E que atura
senão desapaixonados?
Criei-me com meus cuidados;
já agora não saberia
andar noutra companhia.
*
SÁ MIRANDA
"Vilancete"
»1284«
NAID MELO
Nasceu no Brasil. . .


*
Calam-se os protestos
fecha-se o comércio
Congresso em recesso.
*
Escolas sem ensino

igrejas não tocam sinos
família com seus meninos.
*
Escritores deixam as letras
projetos vão pras gavetas
executivos sem as maletas.
*
Até mesmo naturalistas
esquecem o Pôr-do-Sol
toda a nação se extasia:
É tempo de futebol!
*
NAID MELO
"Terra de Campeões"
Viver de Natureza(revista)
Edição 09, abril 2009, S.Paulo, Brasil

»1285«
VIRGÍNIA ARGENTIL
Nasceu a 08 de setembro de 1936, signo de virgem,
em Luanda, Angola, África.
Poetisa, colaborou com vários jornais. . .
*
CANTOePALAVRAS
. . . . . . . . . . . . . .
*
E o vento passa sereno
e o cajueiro ginga
e a marimba geme um hino de amor.
-
Na cubata cansada,
batida pelo vento
e lavada pela chuva,
um corpo disforme
já velho da vida,
em espasmos sôfregos . . .
dedilha,
dedilha,
dedilha a marimba.
-
Gingando como aquele cajueiro,
aquele . . .que se vê além
balançado pelo vento
que acompanha o hino,
-
o pobre velho, tocando,
recorda o passado
e os músculos que teve
e a vida que tinha . . .
-
E o soluço que lhe sai do peito
e o faz curvar sobre a marimba
abafa o som do seu tocar:
a cubata abana lenta
e o céu tristonho chora baixinho
aquela dor e aquele adeus
que é o derradeiro . . .
-
E o vento passou sereno
e o cajueiro gingou
e a marimba gemeu um hino de amor! . . .
*
VIRGÍNIA ARGENTIL
" Gemeu Um Hino de Amor "

"Flores" 
Foto Luis D.

»1286«
LOPES MORGADO
Nasceu em Portugal. . .
Poeta...***
CANTOePALAVRAS
Mulher mãe. . .
-
Mesmo que a noite esteja escura,
Ou por isso,
Quero acender a minha estela.
-
Mesmo que o mar morto,
Ou por isso,
quero enflunar a minha vela.
-
Mesmo que a vida esteja nua,
Ou por isso,
Quero vertir-lhe o meu poema.
-
Só porque tu existes,
Vale a pena!
***
LOPES MORGADO
"Só por isso, Mãe"
Mulher Mãe

»1287«
BELMIRO BRAGA
Belmiro Belarmino de Barros Braga
Nasceu, a 07 de janeiro de 1872, signo de capricórnio,
Vargem Grande, Juiz de Fora, Estado de Minas Gerais,
Brasil. Poeta...
Pertenceu a "Academia Mineira de Letras". . .
Faleceu 31 de março de 1937.
*
CANTOePALAVRAS
Montezinas, 1902; Cantos e Contos, 1906;
Rosas, 1911; Contas do Meu Rosário, 1918;
A Moda, 1918; Tarde Florida, 1923;
Redondilhas, 1934. . .
*
I
Segundo uma lenda antiga,
Maria com S. José,
Fugindo à gente inimiga,
Transpôs caminhos a pé;
-
E, à proporção que Maria
Deixava o rastro no chão,
Todo o caminho floria
De rosas em profusão.
-
Pelos trilhos e barrancas
Das estradas, viu-se em breve
O estendal de rosas brancas
Tudo enfeitado de neve.
-
De um branco suave e doce
As rosas. Nenhuma havia
Pela terra que não fosse
Da cor dos pés de Maria.
-
Depois de tempos volvidos,
Ao peso de imensa cruz,
Pelos caminhos floridos
Um homem passa - Jesus.
-
E sobre o estendal de flores,
De seu corpo o sangue vai
Caindo, e Ele, entre mil dores,
Não geme, nem solta um ai.
-
Passou, e pelas barrancas,
Sob as asas das abelhas,
Dos tufos das rosas brancas,
Brotam rosas vermelhas.
-
Só duas cores havia
De rosas, que aqui registo:
A cor dos pés de Maria
E a cor das chagas de Cristo.
*
BELMIRO BRAGA
"As Rosas"
Rosas
*
II
Pela estrada da vida subi morros,
Desci ladeiras e, afinal, te digo
Que, se entre amigos encontrei cachorros,
Entre os cachorros encontrei-te, amigo!
-
Para insultar alguém hoje recorro
A novos nomes feios, porque vi
Que elogio a quem chame de cachorro,
Depois que este cachorro conheci.
*
BELMIRO BRAGA
"Ao Príncipe"
Rosas
»1288«
PEREIRA DA SILVA
Antonio Joaquim Pereira da Silva
Nasceu a 12 de novembro de 1877, signo de escorpião,
Araruna, Estado da Paraíba, Brasil.
Poeta, seu pai fabricante de violas, integrou vários jornais,
e participou da "Rosa-Cruz". . .
Faleceu, 11 de janeiro de 1933.
*
CANTOePALAVRAS
Vae Soli!, 1903; Solitude, 1918;
Beatitudes, 1919; Holocausto, 1921;
O Pó das Sandálias, 1923; Alta Noite, 1940. . .
*
Que singulares cousas imagina
Consigo mesmo o espírito consciente!
Quem já não viu que o Sol, - o Sol no Poente,
De uma auréola de tédio se ilumina?
-
Oh! o tédio do Sol quando declina!
Tudo que sente e tudo que não sente
Também se embebe imponderavelmente
Dessa mesma imanência vespertina.
-
E é de notar na claridade triste
Desse divino olhar, que a tudo assiste,
Os mesmos tons de todo olhar profundo:
-
Como o palor de sua luz sombria,
Enche os espaços da melancolia
Que lhe deixou tudo que viu no mundo!
*
PEREIRA DA SILVA
"Sol Poente"
Beatitudes
»1289«
HENRIQUETA LISBOA
Nasceu a 15 de julho de 1904, signo de câncer,
em Lambari, Estado de Minas Gerais, Brasil. . .
Poetisa...
Faleceu, 09 de outubro de 1985, 
Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, Brasil.
*
CANTOePALAVRAS
Fogo Fátuo, 1925; Enternecimento, 1929
Velário, 1936; Prisioneira da Noite, 1941;
O Menino Poeta, 1943; A Face Lívida, 1945;
Flor da Morte, 1949; Madrinha Lua, 1952
Azul Profundo, 1958; Montanha Viva, 1959
Além da Imagem, 1963. . .

Estátua
Henriqueta Lisboa
Bronze do artista Léo Santana
 Praça Savassi, Belo Horizonte, Brasil.
*
I
Os Profetas estavam juntos
no adro da igreja. E confabulavam.
A tarde, perturbada, a fundo,
cobria de nuvens a face.
-
Traçavam rudes desenhos
na fímbria do esquivo horizonte
com seus emaranhados ramos,
a selva e o Velho Testamento.
-
O rio, com suas líquidas
camândulas em soluço, fluía
por entre os desvãos da colina
pálida como um corpo virgem.
-
As raras palmeiras em tôrno
como guerreiros, erguendo
com donaire os finos torsos
amparavam o firmamento.
-
Urgia misericórdia
como se confusos augúrios
redundassem daquele encontro
de homens egressos do túmulo.
-
O mesmo pavor causavam
outrora nas estradas bíblicas
suas palavras que eram outras
tantas espadas de fogo,
-
seus gestos de que pendiam
vulcões acesos pelos ares,
seus carros que deixavam sulcos
de maldição e os campos áridos.
-
Porém não lhes servia a língua
para o açoite - com que volúpia
dantes! - nem fremíam ao vento
suas túnicas inconsúteis.
-
Orla de pérola e envolvê-los
naquela estranheza de Lázaro,
dos pedestais soerguiam-se
límpidos luares nostálgicos.
-
Por entre os matizes de Deus
nos lavôres da pedra, tinham
a serenidade perfeita
dos acontecidos destinos.
-
Tal como barcos que através
de largos mares bravios
ao ancoradouro regressam
carregados de especiarias,
-
estavam plácidos os Profetas
e havia um mundo de sombras
ao derredor de suas frontes
sob a poeira de ouro dos séculos.
*
HENRIQUETA LISBOA
"Visão dos Profetas"
Madrinha Lua
*
II
Sob a estrela de maio
como é doce, Maria,
retornar a teus áditos.
-
Como surpreende ver-te,
entre instáveis e efêmeras
sombras, apura imagem.
-
Esta imagem que a infância
- fonte de nostalgia -
traz de auroras desertas.
-
Na mesma nuvem, pairas,
Orna-te a mesma flor.
Tens o mesmo ar de lua.
-
Para os olhos com lágrimas
são teus antigos véus,
não miragem mas flâmula.
-
Nenhuma, nenhuma pátria
foi mais fiel ao viandante.
*
HENRIQUETA LISBOA
"Maria"
Azul Profundo
*
III
Árvore, teu sinête:
tua força na terra, as fundas garras.
Teu pensamento no alto, erecto o corpo.
Tua alegria ao vento, as folhas sotas.
-
Árvore, teu destino:
Essa renúncia, espírito em silêncio
a germinar sementes para o tempo.
Esse ofício de doar - doce espessura
de resina e de sangue e de agasalho.
Essa equanimidade no viver
o puro berço e o leito pegajoso.
-
Árvore, teu fastígio:
Essa beleza, gesto transcendente
acima do horizonte pela graça
de atar e desatar as longas tranças.
Essa beleza vinda de teu cerne,
o róseo cerne a veios trabalhado:
seiva de amor em prometida carne.
-
Árvore, teu mistério a surpreender.
*
HENRIQUETA LISBOA
"Árvore"
Além da Imaginação
*
IV
então, VICENT imaginou
um jardim de outra espécie.
era o arrebol e eram flores,
urzes, flâmulas, auréolas.
Eram touças e mais touças
com bruscos favos de mel.
E eis o Sol girando aceso
para ver por sua vez
a própria luz que se entorna
de dentro dos girassóis.
-
seria o ferrête, acaso,
(por veredas, por atalhos)
das lavras onde a miséria
chagas de fogo lavrava.
Seria a chama da vela
crestando os puros melindres
da palma da mão. Seria
o mesmo fluido das veias
em arremessos de febre
do coração para o linho.
Seria o rubor da face rebentando pelos poros
à bofetada da vida.
Desepêro de retôrno
da orelha que se mutila
por ter ouvido palavra
de frio metal corrupto.
Nunca, tal palavra, nunca,
de escórias adubo fértil,
exalação de paludes
a amargar uma existência
desde as raízes vedadas.
Por que essa alma, à primavera,
de trêmulos punhos verdes
acima do solo em fautos
e taças de âmbar, em brindes
(Sol, girassol, sangue, suor)
com flor de espumas erguesse
o vinho recuperado.
*
HENRIQUETA LISBOA
"Vicent Van Gogh"
Além da Imaginação
*
V
"Meu Jardim"
Foto Luis Dias

Delicadeza de caule
oculta na sombra a flor.
-
Um anjo que ninguém vê
caminha nos corredores
pé ante pé
como sobre tapetes
para não despertar.
-
Malicia fina
dissolve entre os dentes
a palavra que palpitou
na língua
mas que ao silencio volta
para não melindrar.
-
Paciência que não engana
aquecendo sem brilho
à espera
retarda uma vez mais
a carícia
para não assustar.
-
Perola entre perolas
no fundo do mar.
*
HENRIQUETA LISBOA
"Perola"
A Face Lívida
*
VI
É estranho que, após o pranto
vertido em rios sobre os mares,
venha pousar-te no ombro
o pássaro das ilhas, ó naufrago.
-
É estranho que, depois das trevas
semeadas por sobre as valas,
teus sentidos se adelgacem
diante das clareiras, ó cego.
-
É estranho que, depois de morto,
rompidos os esteios da alma
e descaminhado o corpo,
homem, tenhas reino mais alto.
*
HENRIQUETA LISBOA
"É Estranho"
Flor da Morte
*
VII
Mármore seco, nenhum pranto
umedeceu teu corpo liso.
Foi teu destino a solidão,
companheiro perdido.
-
Se alguém chorasse acaso
sobre teu  compacto silencio,
ao Sol secariam as lágrimas
cujo sabor desdenhas.
*
HENRIQUETA LISBOA
"Mármore"
Azul Profundo
*
VIII
Em primeiro lugar as magnólias.
Com seus cálices
e corolas: aquarela
de todas as tonalidades e suma
delicadeza de toque.
Pequena aurora diluída
com doçura - nos tanques.
-
Depois a música: frêmito
e susto de pássaro.
As valsas - que sorrateiras. E as flautas.
As noites com flauta sob a janela
inaugurando a lua nascida
para o suspirado amor.
-
Mais tarde os campos, as grutas,
a maravilha. E o caos.
Com seus favos e sua hidras,
o mundo. O mar com seus apelos,
seus horizontes para o éter
seu desespero em mergulhos.
-
Com o tempo, o ocaso. As lentas
plumas, os reposteiros
com seus moucos ouvidos,
a tíbia madeira para
o resguardo das cinzas,
as entabulações - e com que recuos -
da paz.
-
finalmente os endurecidos espelhos,
os cristais sob o quebra-luz,
dos ângulos o verniz,
o ouro com parcimônia, a prata,
o marfim com seus esqueletos.
*
HENRIQUETA LISBOA
"As Coleções"
Flor da Morte

»1290«
ILKA BRUNHILDE LAURITO
Nasceu, em 1925 em São Paulo, Brasil.
Poetisa...
Homenagens: Premio "Jabuti", 1987 e 1980 . . .
*
CANTOePALAVRAS
Caminho, 1948; A Noiva do Horizonte, 1953;
Autobiografia de Mãos Dadas, 1958; A Janela
de Apartamento, 1968; Sal do Lírico, 1978 . . .
*
I
Esta é a minha quota de estrelas
- ração que uma parede me concede
quando rasga o bloqueio de cimento.
-
E agora é lua cheia. Ou terraplena
se alguém na lua também lembra
de procurar por mim num parapeito.
-
Mordo o céu com pão e manteiga
e cuspo uma estrela cadente
que veio incrustar-se entre os meus dentes.
-
E sorrio agora tão vaga luminosa
que as crianças desligam o videotape
e dançam em meus olhos suas cirandas mortas.
*
ILKA BRUNHILDE LAURITO
"Janela"
Sal do Lírico
*
II
A lua só me interessa
como o fato ao seu mistério.
Só depois do irmão-poeta
astro-homem foi aos céus.
-
A lua na poça d'água
a lua no  alto mar
a lua do meu terraço
eram luas de poetar.
-
A lua televisada
que freqüenta minha casa
como fruta familiar
ressabiada descasco.
-
Da janela eu olho o espaço:
talvez a vida se aclare
talvez a morte se afaste
se eu mudar de gravidade.
-
Tomo um cometa que passa
ou escolho a espaçonave?
Se eu der o primeiro passo
dou viva à Lua! e me mato.
-
Amado, vem me ajudar
neste meu salto mortal.
Se visto a roupa espacial
não posso mais te beijar.
-
Se dispo, então será fácil
sobre mim tua humanissagem.
Que faço, agora, que faço,
entre a visão e a verdade?
-
O poeta nunca sabe
o que é real e é metáfora.
- Que pise a lua quem sabe:
minha opção é o luar.
*
ILKA BRUNHILDE LAURITO
"Canção Modulunar"
Sal do Lírico
»1291«
AURELIANO LESSA
Aureliano José Lessa
Nasceu em 1828, Diamantina, Brasil.
Poeta, formado em Direito em Olinda 1851,
 Estado de Minas Gerais, Brasil.
Amigo de Álvares de Azevedo e Bernardo Guimarães.
Faleceu 21 de fevereiro de 1861.
*
CANTOePALAVRAS
Poesias Póstumas, 1873 . . .
*
dizes que meu amor te encanta a vida,
Teus alvos dias, teus noturnos sonhos;
Mas tens a face de prazer tingida
Teus lábios são risonhos!
-
Não podem florescer o amor e o riso
Nos mesmos lábios: da paixão e fogo
Mata as rosas do rosto de improviso,
Gera a tristeza logo.
-
Olha: minha alma é pálida e tristonha,
Minha fronte enublada e sempre aflita
Dentro em minha alma habita.
-
Mas êsse êrmo sorrir que eu tenho n'alma
Não é como da aurora o riso ardente;
É o sorrir da estrela em noite calma
Brilhando docemente.
-
Ah! se me queres a teus pés prostado,
Troca o riso por pálida beleza:
Mulher! torna-te o anjo que hei sonhado,
Um anjo de tristeza!
*
AURELIANO LESSA
" Tristeza "

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